Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Notificações de Afastamento por Transtornos Mentais em Trabalhadores do Nordeste Brasileiro: um estudo ecológico
Paula Beatriz de Souza Mendonça, Izabelle Bezerra Costa, Vanessa Cristina de G. e S. F. da Costa, Janete Lima de Castro

Última alteração: 2022-01-24

Resumo


Introdução: O trabalho representa para o homem um sentido de vida. Por ser uma atividade essencialmente humana, é considerado um meio de subsistência que cria perspectivas existenciais e auxilia na construção e estruturação da identidade e personalidade do sujeito. Essa compreensão tem sido resultado de uma idealização consolidada temporalmente e está presente no cotidiano do indivíduo. Mesmo diante dos benefícios que atividade laboral proporciona aos trabalhadores, tem-se observado um aumento significativo no número de trabalhadores que apresentam sofrimento psíquico, depressão e doenças associadas ao estresse. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam para dados que correlacionam fatores psicossociais no trabalho e o efeito sobre a saúde do trabalhador. No Brasil, observa-se que os Transtornos Mentais e Comportamentais (TMC) são um dos principais causadores de afastamentos laborais por apresentarem como consequências, a incapacidade e baixa produtividade dos indivíduos acometidos. O Nordeste é a segunda região do país que mais solicita benefícios ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A distribuição de auxílios emitidos por áreas, em 2017, é de 20,1%, em áreas urbanas, e 57,9% em rurais. Já por distribuição de benefícios ativos, 19,0% em áreas urbanas e 49,1% em área rural. A classificação de afastamento por TMC é categorizada, no Capítulo V da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, como a 10ª versão (CID-10). Nessa perspectiva, considerando o cenário nacional, dados apontam que, nos últimos anos, o adoecimento mental assume a terceira posição como causa de afastamentos por auxílio-doença, elegendo-se como um dos principais fatores de concessão de benefício previdenciário. Objetivos: Identificar e apresentar a distribuição espacial dos principais Transtornos Mentais e Comportamentais (TMC) que geram afastamento da atividade laboral de trabalhadores por estado do Nordeste. Métodos: Realizou-se um estudo descritivo com desenho ecológico de série temporal, cuja finalidade é identificar a distribuição de TMC em trabalhadores da região Nordeste. A escolha da região Nordeste deu-se por dois motivos: primeiro por ser a Região do País onde se concentra maior número de Estados entre Regiões do Brasil; sendo eles o Estado da Bahia (BA), Pernambuco (PE), Ceará (CE), Maranhão (MA), Paraíba (PB), Rio Grande do Norte (RN), Piauí (PI), Alagoas (AL) e Sergipe (SE), e o segundo por ser a segunda mais populosa com cerca de 56.560.081 habitantes. Para a coleta de dados, foram contemplados os registros sobre transtornos mentais e comportamentais em trabalhadores classificados pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) que tenham obtido afastamento laboral em decorrência de TMC. A coleta foi realizada no mês de março de 2020 a partir das informações apresentadas pelo Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (Smartlab) mediante o download das informações notificadas no período de 2012 a 2018. A análise foi realizada por meio da linguagem de programação Python. Os auxílios-doença foram subclassificados em afastamentos acidentários (B91) e não acidentários (B31), conforme classificação do Smartlab. Para o desenvolvimento desse estudo, não foi necessária a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), uma vez que utilizaremos dados de domínio público, conforme Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde. Resultados: As concessões de auxílios por afastamentos conforme as categorias de doenças foram registradas para afastamentos não acidentários (B31) e acidentários (B91). O grupo de TMC teve o expressivo quantitativo de 135,8 mil casos para B31 e 12,8 mil para B91, entre os Estados da região Nordeste, notificadas entre o período 2012 a 2018. A BA apresentou maior número de casos notificados para B31, e o RN e para B91. Entre as principais doenças classificadas, no capítulo V, que mais acometem os trabalhadores por afastamento das suas atividades laborais, encontram-se: Episódios Depressivos (F32); “Reações ao “stress” grave e transtornos de adaptação” (F43); Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool (F10); Transtorno Afetivo Bipolar (F31); Esquizofrenias (F20); Transtornos fóbicos-ansiosos (F40) e Outros transtornos mentais devido à lesão e disfunção cerebral e a doença física (F06). Os Transtornos Fóbicos e ansiosos obtiveram o maior número de notificações entre os Estados em relação ao número de habitantes por Estados. Apresentaram um total de 272 mil notificações de afastamento laboral para B31 e 2 mil para B91. O RN e AL se destacaram como os Estados que concentra maior percentual de casos de afastamento por TMC. No ranking das 30 atividades econômicas ativamente legalizadas no Brasil, foram consideradas as que apresentaram acima de 100 notificações. Atividades econômicas analisadas, a que mais se destaca é a administração pública em geral, significando que os trabalhadores que trabalham nesta atividade estão mais vulneráveis ao adoecimento por TMC para B31. Já a que apresentou menor vulnerabilidade foi administração de cartões de crédito, tanto para B31, quanto para B91. Os trabalhadores do RN sofrem mais por TMC comparados aos demais Estados para B31 e o MA apresenta menor índice de notificações por afastamento. O Estado de AL com maior afastamento B91 por nexo causal com a exposição no trabalho, e o MA com o menor índice de afastamento. Considerações finais: A compreensão dos fenômenos que acarretam o afastamento do trabalhador de sua atividade laboral é um dos objetivos da política da saúde do trabalhador. Este estudo contribui com a identificação dos principais transtornos que estão acometendo os trabalhadores. Dentre os TMC, os Transtornos Fóbicos e ansiosos apresentaram-se como destaque e enquadraram o RN como o Estado com maiores casos de notificações em trabalhadores para B31 e AL para B91. A administração pública representa maior índice de afastamento laboral em toda a região Nordeste para B31, não correlacionado com o trabalho, entretanto, pode evidenciar uma subnotificação do nexo causal com a atividade laboral. Algumas causas, como a flexibilização do asseguramento dos direitos trabalhistas e a precarização das condições de trabalho e pela centralidade do vínculo de trabalho nas capitais dos estados podem contribuir para que os índices de afastamento por TMC continuem aumentando nos próximos anos. Destaca-se ainda, a subnotificação associada ao despreparo do diagnóstico precoce. É imprescindível que a sociedade compreenda e se conscientize sobre processo saúde-doença associado ao trabalho. A saúde do trabalhador deve ser prioridade para as esferas legislativas e executivas do país, na adoção de mecanismos relacionados às políticas públicas efetivas no enfrentamento desta grave crise de saúde pública. Os achados desse estudo apontam para a necessidade de novas pesquisas que busquem identificar os fatores associados ao adoecimento mental do trabalhador e, consequentemente, de seu afastamento da atividade laboral. Em concordância a esse ponto, a OMS e OIT defendem a identificação dos principais transtornos mentais e atividades econômicas que estão levando a classe trabalhadora ao adoecimento mental, dada a urgência de evidenciamos discussões em torno desta temática que impactam diretamente nas condições sociais e econômicas do país.