Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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A formação de estudantes de psicologia a partir da inserção híbrida no campo da atenção básica durante a pandemia da Covid-19
Maryssol Monteiro Fernandes do Nascimento, Mayara Monteiro Fernandes do Nascimento, Cristal de Aragão, Thiago Melício

Última alteração: 2022-01-21

Resumo


A pandemia da covid-19 não só modificou o cenário econômico, social e político no Brasil e no mundo, como “virou de cabeça para baixo” o modo como se pensa e se constrói a educação. Em nome da segurança sanitária, reinventamos a vida e a formação nas universidades que passou a acontecer por meio de telas. O Programa de Educação pelo Trabalho (PET-Saúde/ Interprofissionalidade), proveniente do edital do Ministério da Saúde n.10, 2018, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) selecionou uma equipe interprofissional de estudantes, preceptores e professores para atuarem no Sistema Único de Saúde, como acontece a cada edital. As atividades deste programa foram continuadas, posteriormente, por meio de programa de extensão da universidade. Só que em 2020 houve uma particularidade: tudo aconteceu online. De 2020 a 2022, diversas frentes de trabalho desenvolveram atividades virtuais ofertadas aos usuários e profissionais de saúde inseridos em três clínicas da família integradas à Área Programática 3.1 (AP 3.1), na Zona Norte do Rio de Janeiro. No atual cenário, com a vacinação dos cidadãos e com a melhoria do quadro sanitário, inicia-se um gradual processo de transição para o início das atividades presenciais, juntamente com os seus desafios. Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo analisar os efeitos desses dois modos de inserção na Atenção Básica, online e presencial, na formação de estudantes de psicologia. A metodologia utilizada é o relato de experiência, o qual possibilita uma narrativa mais afetiva e ancorada no cotidiano dos processos envolvidos. Durante o período em que as atividades ocorriam de forma online, nós tivemos a oportunidade de participar de diversas frentes de trabalho e aqui nos limitaremos a abordar algumas. Acompanhamos os processos de construção de rede entre diferentes atores do território: profissionais do NASF das unidades básicas, bem como dos CAPS III e CAPS III AD de referência no território e discentes e docentes do PET-Saúde da UFRJ se reuniam para compreender as demandas de saúde da AP 3.1, as quais mudavam completamente semana após semana. Ademais, outra atividade que desenvolvemos foi a de um trabalho intersetorial e interprofissional, entre PET e o CRESAM (Centro de Referência em Saúde da Mulher), uma Organização Não Governamental localizada na Penha que se propõe a trabalhar em prol da prevenção de IST’s e participação social de mulheres e adolescentes. Produzimos rodas de conversa virtuais com as mulheres do território, construindo um trabalho grupal de promoção de saúde. Por fim, outro projeto importante foi o Telemonitoramento de síndrome gripal, em que os estudantes faziam ligações telefônicas a fim de acompanhar o curso da doença de usuários atendidos na Equipe de Resposta Rápida (ERR) da Unidade, propiciando um acolhimento e acompanhamento destes que estavam com suspeita de ter covid-19. Tal ação tinha o objetivo de ofertar um cuidado, mas também de desafogar a demanda de trabalho das equipes mínimas, as quais foram muito sobrecarregadas durante toda a pandemia. Neste sentido, apesar da limitação do trabalho devido ao fato de não estarmos no ambiente físico da clínica da família e dos demais atores do território, pudemos construir frentes de cuidado pautadas na intersetorialidade e interprofissionalidade, agindo em rede, articulando ações coletivas e buscando a produção de vida perante o assombro da morte em um contexto de pandemia. Experiências potentes na nossa formação pelo SUS. Contudo, também constatamos durante o modelo virtual de formação, uma distorção no espaço-tempo. Entre docentes e discentes, havia a sensação de que existia a possibilidade de executar muitos projetos. Então, em diversos momentos, nos sentíamos exaustos e sobrecarregados com tamanho volume de reuniões e atividades. Ao final, percebemos que o online por vezes gera certa ilusão, uma presença sem tanta presença, que necessita ser melhor manejada. Outro fator relevante é que no modelo online, os alunos não conheciam presencialmente muitos profissionais da rede com os quais trabalhavam semanalmente, a não ser por fotos ou números de whatsapp. Isto se demonstrou como entrave para o protagonismo dos alunos frente às atividades, já  que o trabalho de articulação do PET e do projeto de extensão com os profissionais do SUS ficava mais a cargo, ao menos inicialmente, com os docentes do programa da UFRJ. No segundo semestre de 2021, um novo paradigma sanitário começou a se esboçar com a chegada da vacinação no país, mas a educação universitária da psicologia na UFRJ continuou virtualmente, apenas com algumas novas possibilidades, como a ida de estudantes aos seus estágios, com turnos e horários reduzidos e com todos os cuidados sanitários. Assim, nós pudemos iniciar o processo de estarmos presentes fisicamente nas Clínicas da Família, as quais, desde o início da pandemia, só conhecíamos pelas histórias contadas por ex-estagiários e pelos próprios professores. Com o uso de EPIs, fizemos visitas domiciliares, conhecemos pessoalmente os preceptores, o ambiente e escolhemos um turno da semana. Apesar dessa retomada ainda estar sendo gradual, já pudemos constatar outros modos de contribuições que essa inserção possibilita à formação: participação de grupos com os usuários, atendimentos individuais, participação em reuniões intersetoriais e com as equipes mínimas, assim como o acompanhamento da dinâmica da clínica e da rotina dos trabalhadores, o que inclui seus desafios inerentes. Desafios relacionados à estrutura das clínicas, à falta de recursos e à sobrecarga de trabalho e atividades. Há, no modo presencial, a concretude do cotidiano. Além disso, existe nesse modelo, a possibilidade de convivência com os diferentes profissionais das equipes mínimas e também dos profissionais do NASF. Assim, conseguimos com as ações presenciais estar circulando com os trabalhadores pelo território, realizando visitas domiciliares e conhecendo os equipamentos de saúde, lazer, educação e justiça. Podemos compreender como ali, na especificidade daquele território, se produz vida e quais atores aumentam essa potencialidade. Por fim, consideramos que, mesmo por meio de telas, foi possível em quase dois anos ininterruptos desse modelo de formação online, produzir e construir aprendizado, promovendo uma formação sólida em saúde. Acreditamos que estar fisicamente na clínica, acompanhando a rotina como esta se apresenta, é sem dúvida muito potente, mas também apontamos para a importância de manter certas facilidades que esse modo virtual proporcionou para o trabalho no SUS. Inúmeros encontros e trocas puderam ocorrer entre profissionais de diferentes regiões do país devido a esse “boom” de ofertas de plataformas virtuais, assim como foram construídas várias oficinas para usuários, muitos seminários e congressos. O importante é continuarmos construindo possibilidades de vida e formação, nas telas e fora delas.