Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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No epicentro da formação – O que dizem residentes e preceptores das Residências em Saúde sobre a Estratégia Saúde da Família na pandemia de COVID-19.
Amanda Cavalcante Frota, Amanda Cavalcante Frota, Ivana Cristina de Holanda Cunha Barreto, André Luís Bonifácio de Carvalho, Assis Luiz Mafort Ouverney, Alessandro Jatobá, Luiz Odorico Monteiro de Andrade, Nádia Maria da Silva Machado, Ana Paula Silveira de Moraes Vasconcelos

Última alteração: 2022-01-30

Resumo


Apresentação: A Organização Mundial da Saúde declarou a pandemia de COVID-19 em 11 de março de 2020 e pouco mais de um ano depois, em 7 de abril de 2021, Dia Mundial da Saúde, o Brasil, foi considerado o epicentro da doença no mundo com 337 mil óbitos, média móvel de 2.775 óbitos diários, chegando a mais de 4.000 mortes em 24 horas. Em situações de crises, que tensionam o sistema de saúde, como durante a pandemia da COVID-19, é imprescindível pensar qual modelo social e sistema de saúde se almeja para a proteção da vida, sobretudo a dos mais vulneráveis. A Política Nacional de Atenção Básica destaca o papel da Estratégia Saúde da Família (ESF), como principal componente do arcabouço da APS, que hoje acompanha cerca de 134 milhões de pessoas em todas as regiões do Brasil, com 62,62% de cobertura populacional, 43.286 equipes (EqSF) e cerca de 260 mil agentes comunitários de saúde, atuando de forma capilarizada na promoção, prevenção, atenção e vigilância em saúde, por meio da vinculação populacional e territorial de pessoas usuárias às equipes multiprofissionais. A atuação da ESF deve ser destacada na linha de frente do enfrentamento à COVID-19 e sua avaliação no curso da pandemia é oportuna para seu fortalecimento e consecução de efetividade. As Residências Multiprofissionais em Saúde da Família (RMSFC) e Medicina de Família e Comunidade (RMFC) têm sido estratégias indutoras utilizadas com vistas a remodelar os processos de trabalho na ESF. O processo de aprendizagem dos residentes se dá pelo trabalho e por meio da vivência e interação com a gestão, a comunidade e com os profissionais dos cenários de prática onde desenvolvem suas atividades. Considerando o contexto descrito, o presente artigo objetiva analisar o processo de trabalho da ESF na pandemia de COVID-19, segundo residentes e docentes (preceptores, tutores, supervisores, coordenadores) das residências em saúde. Desenvolvimento: Estudo transversal, descritivo e analítico, com levantamento de dados primários, coletados por meio de um inquérito nacional via um survey eletrônico, realizado no 2º semestre da pandemia. Participaram residentes e docentes das residências médicas e multiprofissionais em saúde, em atuação e interação formativa na ESF no curso da pandemia. Buscou-se uma análise multidimensional do processo de trabalho das EqSF, composta por 08 núcleos temáticos: (1) Perfil demográfico e profissional dos profissionais em atuação formativa na ESF; (2) Novos fluxos e rotinas na ESF por ocasião da COVID-19; (3) Atenção prestada a suspeitos, doentes e contatos de COVID-19; (4) Medidas de proteção domiciliar e ocupacional dos profissionais para a COVID-19; (5) Práticas de promoção da saúde; (6) Práticas de vigilância em saúde;  (7) Práticas dos conselhos locais de saúde; (8) Manutenção dos serviços de rotina da ESF. O questionário de coleta constou de 131 questões de múltipla escolha, com opções de respostas binárias e escala (Likert) com 5 opções alternativas. A coleta de dados foi realizada entre setembro de 2020 e março de 2021. Os dados foram analisados através de frequência simples para um grupo de variáveis, extraídas de 30 questões do questionário, relacionadas aos eixos 1 a 6. Todos os documentos relativos à pesquisa foram submetidos e aprovados por Comitê de Ética em Pesquisa no âmbito da FIOCRUZ. Resultados: Participaram 399 sujeitos das cinco regiões do Brasil, sendo 57,39% do Nordeste e 22,56% do Sudeste. Prevaleceu a participação de mulheres (78,95%); faixa etária de 20-39 anos (69,42%); atuantes em áreas urbanas (82,46%); integrantes de RMSF (60,43%) e RMFC (24,12%). Quanto aos segmentos, 58,40% são residentes, 29,57% preceptoras e 12,03% tutoras-supervisoras-coordenadoras, distribuídos entre enfermeiras, médicas, dentistas e profissionais do NASF. Destas  55,30% apresentou suspeita de COVID-19; 91,05% realizou teste laboratorial; 19,67% testou positivo e 16,94% realizou a testagem por meios próprios. A ocorrência de óbitos entre integrantes das equipes foi afirmada por 5,40% das participantes. Constatou-se a que 79,36% dos usuários do território de atuação têm a UBS tem como 1ª referência de cuidado na COVID-19. Dentre as principais atividades relacionadas a COVID-19, destacaram-se: ‘apoiando acolhimento, triagem, estruturação do fluxo de atendimento’ (71,95%); ‘realizando atendimento e procedimentos individuais (63,41%); ‘realizando visitas domiciliares’ (51,83%); ‘acompanhando usuários por atendimento remoto (50%); ‘realizando seguimento das pessoas suspeitas e/ou confirmadas de COVID-19’ No que se refere à capacitação para manejo da doença, 14,19% das residentes afirmou ‘não ter realizado’ e dos que realizaram destacaram como principais temáticas foram: ‘abordagem clínica’ (82,31%), ‘uso de EPI’ (74,62%), ‘sistemas de informação em saúde e notificação’ (53,85%). Houve ‘implementação de fluxos exclusivos para sintomáticos respiratórios(SR) nas unidades básicas de saúde’ segundo 93,26% das preceptoras e 86,59% das residentes; espaço/sala reservada na UBS para atendimento exclusivo de SR’  88,76% das preceptoras e 74,39% das residentes. A ‘intensificação da rotina de limpeza das UBS’ foi afirmada por 87,64% e 78,66% respectivamente entre preceptoras e residentes. Para proteção ocupacional, nenhum dos EPI alcançou 80% de respostas como ‘disponibilidade suficiente nas UBS de atuação’, resultando em 41,20% para máscaras N95, 43,45% para óculos de proteção, 50,56% para avental descartável/impermeável, 56,93% para protetor facial, 64,42% para máscara cirúrgica, 72,66% para luva de procedimentos e 78,65% para sabão para lavagens de mãos. A realização de testes rápidos e testes RT-PCR nas UBS de atuação quando somadas as opções ‘ocasionalmente/raramente/nunca realizados’ foi considerada por 41,28% e 59% das participantes. Considerações finais: A pandemia de COVID-19 no Brasil evidenciou as práticas de processos formativos na modalidade residências em saúde com base nos princípios do SUS, além de desafiar os demais trabalhadores, enquanto  docentes em serviço, para o aprimoramento profissional e atualização das práticas de cuidado territorial em saúde e de formação pelo trabalho. Os territórios prioritários das ESF são os mais suscetíveis ao adoecimento e morte por COVID-19, pois são usualmente marcados por iniquidades sociais, situação epidemiológica de alta carga de doenças infecciosas, elevada prevalência de condições crônicas, sofrimento psíquico, além de uma carga importante de causas externas. A ESF, dada a sua capilaridade, cobertura e ingresso de novas usuárias no período, é porta de entrada muito frequente, senão a principal, de casos de COVID-19. Os profissionais residentes e docentes dos programas de RMSF e RMFC atuaram na linha de frente da COVID-19 e, sem dúvida, contribuíram para o fortalecimento da ESF. As residências implementaram suas ações nos locais de vida da população, em convívio com as realidades sociais e, portanto, estiveram no epicentro da formação, uma vez que o Brasil está entre os países com maior número de óbitos. No entanto, os resultados revelaram fragilidades no processo de trabalho em Saúde da Família, uma vez que as equipes de profissionais residentes e docentes precisam estar integralmente ‘preparadas, protegidas e equipadas’ para a consecução do cuidado qualificado de usuárias previamente vinculadas e de usuárias que acessaram a ESF por ocasião da COVID-19. Residentes são o futuro no presente do SUS.