Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Sobre a adoção do método de Instrução ao Sósia em um serviço de saúde (narrativa da experiência)
Sandra Regina Peixoto de Sousa, Ândrea Cardoso de Souza

Última alteração: 2022-02-01

Resumo


Considerando que o processo de trabalho acontece no cotidiano, e que se produz no encontro entre os profissionais e usuários e profissionais e profissionais é preciso desenvolver possibilidades de análise mais leves, pautadas nas conversas, nos debates, nos encontros. A Instrução ao Sósia (IAS) é um método que visa contribuir na análise dos processos de trabalho e se insere no campo Clínica da Atividade, sendo mais utilizado na psicologia e na educação. A instrução ao sósia consiste em um método, porém, é possível compreendê-lo também como uma estratégia ou dispositivo de intervenção, um modo de pesquisar, entre outros. A IAS constitui uma potente ferramenta de análise dos processos de trabalho, pois contribui para que diálogos sobre os processos de trabalho, a análise dos mesmos, visando a transformação do serviço. Este estudo trata-se de uma narrativa da experiência da adoção de grupos de IAS em uma pesquisa realizada no ambulatório de oncologia de um hospital público universitário no estado do Rio de Janeiro, com a equipe de enfermagem. Por conta da pandemia da Covid-19 parte da equipe de pesquisa e alguns participantes da equipe de enfermagem participaram de modo online, por meio do Google Meet. Foram realizadas três reuniões de aproximadamente 120 minutos cada. Estas contaram com a participação de enfermeiros, residentes de enfermagem, técnicos, e auxiliares de enfermagem, além da equipe de pesquisa. Na primeira reunião, uma das pesquisadoras coordenou a reunião, pedindo no primeiro momento que cada um se apresentasse e em pouco tempo falassem de sua experiência profissional e uma dinâmica inicial para que a equipe se sentisse mais à vontade, e assim todos puderam falar sobre o que curtiam ou não no trabalho do referido setor. Surgiram questões como: “não curto fazer múltiplas punções num mesmo paciente...”, ou ainda:” não curto retirar larvas de lesões em pacientes...”, e posteriormente, foi apresentado o método e a proposta para o acontecimento dos grupos. Inicialmente, foi solicitado ao grupo eleger um integrante para ser um “instrutor” para a próxima reunião em que se daria a instrução propriamente dita e que elegesse parte do trabalho no setor para que o trabalhador-instrutor instruísse a pesquisadora-sósia como sua substituta. Também, foi solicitado que escolhessem um tema para que fosse trabalhado durante os grupos de IAS. Assim elegeram um instrutor e a punção venosa periférica como tema central. A segunda reunião ocorreu uma semana após a primeira, nesta, o instrutor instruiu a pesquisadora-sósia como sua substituta, estabelecendo o diálogo na segunda ou terceira pessoa. Esta etapa foi iniciada com uma pergunta chave do método, a qual foi feita pela pesquisadora-sósia: “Amanhã vou te substituir aqui no setor, como devo me comportar para que ninguém perceba que não sou você?” E assim o instrutor começou a descrever como ela deveria proceder. Esta reunião, aconteceu na sala de quimioterapia, e contou com a participação de integrantes da equipe de modo presencial e on-line. Este encontro foi exaustivo, pois de acordo com o método, somente instrutor e sósia poderiam falar e a explicação sobre as técnicas e habilidades necessárias para a punção venosa, precisava e foi bem detalhada, minuciosa, sendo o instrutor interrompido sempre que necessário para que a sósia compreendesse o procedimento. Este momento foi muito interessante. Ao final desta segunda reunião foi perguntado ao instrutor trabalhador:” como foi para você esse exercício de instrução?” E o mesmo respondeu que tinha sido tranquilo, apesar de muito cansativo. E que não sabia e nem imaginava ter tanto para falar da rotina do serviço. Pois é esperado que algumas pessoas sejam profundamente afetadas por esta experiência. Importante o pesquisador estar atento, e mesmo aberto a prestar auxílio, se necessário, caso o participante seja tomado por algum sentimento, seja ele qual for, após instrução. Até porque a essa altura já existe uma relação de confiança entre ambos. No último encontro, foi encomendado ao instrutor trazer um relato escrito e este desenvolveu tal atividade em casa. Os demais participantes, também foram convocados a falar sobre a experiência, principalmente, se procederiam de modo distinto se fossem instruir a sósia. O terceiro encontro ocorreu quinze dias pós o segundo e todos preparam a encomenda. O instrutor relatou que não mencionou em nenhum momento a relação profissional-paciente, mas se ateve as questões técnicas do trabalho. Outro participante mencionou ter sido muito difícil ficar só ouvindo alguém falar sobre um trabalho que também desenvolve. Ao término do encontro, foi solicitado aos participantes que tecessem comentários sobre a participação na experiência de IAS. Muitos relatos de aprendizado e de oportunidade. No entanto, de modo uníssono, os participantes mencionaram que não conversam sobre os processos de trabalho no cotidiano do serviço e que os encontros de IAS corroboraram para trazer à superfície o desejo do setor de contar com reuniões de equipe para pensar e discutir os processos de trabalho. Quando os trabalhadores são confrontados por uma reflexão, refletem sobre a ação, geralmente no momento não sabem como agir[KM1] e são instigados obrigados [KM2] a se reinventarem, e as dificuldades que se apresentam no cotidiano do serviço sobem a superfície trazendo momentos de questionamentos e reflexões enriquecendo o trabalho. Para a Clínica da Atividade, o trabalho é uma atividade transformadora, que a partir do encontro social, os sujeitos são transformados, isso ocorre a cada encontro a partir da aproximação com o outro e do enfrentamento das necessidades. Os processos de trabalho em saúde são porosos aos profissionais e ou usuários, o que torna o cotidiano do serviço mais dinâmico, e por vezes, imprevisível. O diálogo suscitado pela experiência de IAS no ambulatório de oncologia foi tido como positivo pela equipe, visto que foi considerado um método eficaz para que análises dos processos de trabalho pudessem ocorrer. Podemos considerar que os encontros de IAS ampliaram o poder de agir da equipe.

[KM1]Eles não sabem como agir ou refletem sobre a ação?

[KM2]Os trabalhadores são “obrigados” ou são incitados, instigados?