Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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PROGRAMA MULHERIO: AÇÕES PÚBLICAS FEMINISTRAS NA GESTÃO PÚBLICA
Paula Land Curi, Thais Ferreira Rodrigues

Última alteração: 2022-02-07

Resumo


APRESENTAÇÃO: O presente trabalho pretende tecer considerações acerca das possibilidades da extensão universitária dialogar e interferir na gestão pública ao analisar o Programa Extensionista “Mulherio: Tecendo Redes de Resistência e Cuidados GSI/PROEX/UFF”, enquanto implementador de políticas para mulheres na cidade de Niterói. Está diretamente imerso e relacionado ao contexto político atual de ataques às políticas públicas para mulheres, que obtiveram um avanço a partir de 2003, mas que foram duramente atacadas a partir do golpe de 2016. Dentre as políticas para mulheres formuladas pelo governo federal neste período de fortalecimento da pauta, destacam-se as políticas de enfrentamento às violências contra as mulheres, implementadas pelas instâncias municipais. São políticas que precisam ser articuladas em rede, implementadas e efetivadas de forma transversal, porém, enfrentam dificuldades em decorrência do patriarcalismo estatal estrutural que configura o próprio Estado como um espaço hostil e reprodutor de violências contra as mulheres, o que saliente a necessária ocupação dos espaços de poder e de ação pública com ideias feministas que possam, despatriarcalizar o estado, tornando-o seguro e adepto à implementação das políticas de gênero. Defende-se, portanto, políticas públicas generificadas, com foco em políticas de saúde, considerando as desigualdades de gênero como relevantes determinantes em saúde.

O Programa Mulherio, além de instrumentalizar um processo dialético, interdisciplinar e intersetorial em relação às mulheres e às políticas públicas, vem se constituindo enquanto proposta de uma formação política feminista que vem se alinhando com o que tem sido denominado a quarta onda do feminismo brasileiro. Talvez menos pelo viés tecnológico que esta traz como marca, através dos ativismos digitais, mas pelo lugar de destaque alçado na sua participação na formulação de políticas públicas em instituições, no município em que acontece. O Programa tem se voltado para o auxílio de gestores públicos na sustentação de políticas públicas de enfrentamento às violências de gênero, fortalecendo o ativismo feminista através de um movimento de dentro para fora, feita pela associação com diversos coletivos feministas, em momento que a luta pela justiça e o resistir se tornam ainda mais fundamentais.

Defende-se então que ao atuar junto à gestão municipal de Niterói, tanto no atendimento das mulheres em situação de violência, quanto na formação de agentes públicos ao oferecer atividades que discutem a problemática das violências contra as mulheres, o Mulherio assume um papel na “burocracia de rua” da cidade. Além de que, ao dialogar com os Organismos de Políticas para as Mulheres em reuniões da rede intersetorial, o Programa está participando da avaliação das políticas e auxiliando na identificação de rotas críticas, inclusive.

DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Para desenvolver o proposto, a pesquisa utilizou três frentes de análise diferentes. O primeiro foi o levantamento bibliográfico e utilização de dados e documentos públicos disponibilizados em sites oficiais e portal da transparência do município. O segundo foi a análise dos resultados obtidos na Pesquisa e Extensão “Mulherio no enfrentamento à pandemia de COVID-19: dirimindo o impacto das violências contra as mulheres e meninas”, executada em 2020.

Partindo do pressuposto que é dever do poder público, com ou sem pandemia em curso, garantir às mulheres o direito por uma vida livre de opressão, discriminação, violências e violações, a pesquisa teve como objetivo a produção de um relatório diagnóstico circunstanciado sobre o grau de institucionalidade das políticas municipais de enfrentamento às violências de gênero, exacerbadas pela pandemia, em Niterói.

Foram escolhidos eixos das políticas entendidos como fundamentais e utilizamos uma ferramenta que mede o grau de institucionalidade das políticas públicas. Através deste instrumento, é possível converter institucionalidade em unidade de medida, a partir de indicadores multidimensionais, para auxiliar gestores na tomada de decisão.

Para isso, considera sete dimensões, a saber: regulamentação/instrumentais de análise e planejamento; financiamento e orçamento; gestão; recursos humanos; rede de serviços; assistência e controle social. Em relação à construção de um indicador sintético, a proposta permite a utilização de um número de dimensões e indicadores de acordo com o grau de aproximação desejado, como também a utilização de um sistema de pesos.

Por último, o Programa Mulherio realizou em formato remoto o “Seminário de Políticas Públicas para o Enfrentamento às Violências de Gênero contra as mulheres da cidade de Niterói” entre os dias 29 de novembro e 4 de dezembro de 2021. Reuniu no evento trabalhos de profissionais, pesquisadores, estudantes e integrantes dos movimentos sociais que desenvolvem atividades nas redes intersetoriais de enfrentamento às violências gênero contra as mulheres e/ou ações a elas destinadas.

Através da participação na organização do Seminário em conjunto com os Mecanismos Institucionais de Políticas para Mulheres da cidade de Niterói, foi possível fazer uma observação participante da relação entre universidade e gestão pública, além do funcionamento dos próprios organismos. Durante a realização do Seminário foi possível também avaliar o programa Mulherio enquanto agência avaliadora das políticas implementadas pelo município.

RESULTADOS/IMPACTOS: Niterói é uma cidade que caminha, atualmente, na contramão do nível federal. Segue “lutando” para que as políticas públicas para as mulheres sejam implementadas enquanto políticas de Estado.

A proposta de aferição do grau de institucionalidade vem ao encontro da necessidade de se reduzir o caráter de improviso na gestão pública, sustentando uma articulação entre técnica e política, possibilitadora do refinamento e da efetivação de um projeto de governo que atenda às necessidades das mulheres durante a pandemia.

Os seis pontos analisados nos dão evidências que, a despeito de alguns pontos fortes, a exemplo da presença de diversos dispositivos, serviços, recursos e mesmo controle social, encontramos que, até o ano de 2020, havia uma baixa institucionalidade nas políticas públicas de enfrentamento às violências contra as mulheres. As consequências deste quadro foram ainda exacerbadas pela pandemia de Covid-19, produzindo ainda mais Rotas Críticas.

Em relação ao papel do Programa Mulherio, por sua vez, os resultados preliminares até o presente momento, apontam que o programa está inserido em diferentes etapas do ciclo de políticas públicas municipais. Seja na formação de profissionais que atuam na gestão, nos cursos de formação feminista ou que abarcam temáticas fundamentais para as mulheres como as violências de gênero oferecidos em parceria com os órgãos municipais. Seja na assessoria e diagnóstico do Plano Municipal de Políticas para Mulheres e na avaliação das políticas, o Programa interfere diretamente na implementação de políticas e contribui para diminuir a dominação masculina nos espaços de poder decisório.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: Embora a pesquisa ainda não tenha sido finalizada, considera-se uma escolha acertada as diferentes metodologias utilizadas na medida em que a observação participante presencial esteve comprometida em decorrência da COVID-19 que impôs a necessidade de atividades remotas. As próprias ações desenvolvidas pelo Programa Mulherio desde 2020 também sofreram adaptações e precisam ser avaliadas quando forem retomadas presencialmente.

Ressalta-se que em 2021, ano seguinte à pesquisa que mediu a institucionalidade das políticas, contou com uma nova gestão municipal. Houve uma tentativa de reorganização dos Mecanismos Institucionais de Mulheres na cidade de Niterói, por exemplo. Faz-se necessária, portanto, a continuidade da pesquisa para averiguar a institucionalidade das políticas neste novo momento.