Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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COMPETÊNCIAS INTERPROFISSIONAIS PARA A GESTÃO DO CUIDADO NO PROCESSO FORMATIVO DA RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE DA FAMÍLIA DE SOBRAL-CE
Marcos Aguiar Ribeiro, Isabel Cristina Kowal Olm Cunha, Izabelle Mont'Alverne Napoleão Albuquerque

Última alteração: 2022-02-23

Resumo


Apresentação:

A formação em saúde precisa se ancorar em concepções e práticas pedagógicas que promovam significativas conexões com o cotidiano do Sistema Único de Saúde (SUS) e com o desenvolvimento de competências que tenham como referência a educação e práxis interprofissional. Neste sentido, encontram-se as Residências Multiprofissionais em Saúde (RMS) que se configuram como significativos processos formativos.

No Brasil, a RMS surgiu pela primeira vez em 1978 por meio da Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul, mais especificamente na Unidade Sanitária denominada São José do Murialdo. A partir da década de 1990 começam a surgir diferentes programas de RMS no Brasil. Em Sobral, no interior do estado do Ceará, a primeira turma de residência iniciou em 1999 com financiamento próprio e contou com a participação de 64 residentes médicos e enfermeiros, que se encontravam inseridos na Estratégia Saúde da Família (ESF) de Sobral. A primeira turma teve como objetivo preparar e ressignificar o trabalho dos profissionais da ESF tendo como ênfase a promoção da saúde. A segunda turma iniciou em 2001 e contou com 59 residentes de diversas categorias profissionais.

Nesta perspectiva, as RMS têm como objetivo articular os conhecimentos, habilidades e atitudes em uma perspectiva colaborativa e interprofissional, por meio do desenvolvimento de uma formação no cotidiano da Estratégia Saúde da Família.

A partir de então, o estudo tem como objetivo descrever as competências interprofissionais para a gestão do cuidado no processo formativo do programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família de Sobral – CE.

Desenvolvimento do Percurso Metodológico:

Estudo exploratório descritivo, sob abordagem qualitativa realizado por meio da cartografia. Buscou descrever as competências interprofissionais para a gestão do cuidado no processo formativo do programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família de Sobral – CE a partir da experiência do pesquisador em contato com o campo, nesse caso, como docente do programa de residência da Escola de Saúde Pública Visconde de Sabóia, em seu período de atuação. As “territorializações” e “desterritorializações” foram realizadas por meio de própria experiência do pesquisador, seja através das experimentações de outros residentes trazidas ao longo do processo de trabalho e que estão presentes em depoimentos, sistematizações em diário de campo e relatórios pedagógicos. Para o delineamento da Cartografia, utilizou-se como marco teórico-metodológico os autores Gilles Deleuze e Félix Guattari. Os dados foram sistematizados com o suporte do software NVIVO 11 e analisados por meio de análise temática. Estudo apresenta parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisas.

Resultados:

Para a sistematização das competências interprofissionais para a gestão do cuidado no processo formativo do programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família, utilizou-se como referência o conceito de gestão do cuidado proposto por Cecílio (2011) e que considera múltiplas dimensões, imanentes entre si, a saber: individual, familiar, profissional, organizacional, sistêmica e societária.

No processo formativo da RMS, faz-se necessário percorrer cada dimensão da gestão do cuidado a partir de vivências, práticas e experimentações no cotidiano do SUS. As dimensões interagem entre si e complementam-se em um movimento que promove ressignificações na formação do residente e qualificação da atenção aos usuários.

Na dimensão individual, o residente vivencia de forma significativa o encontro com usuários do SUS. Deste modo, transversalmente ao processo de cuidado é necessário o reconhecimento das singularidades do sujeito a partir do acolhimento, da amorosidade e de uma escuta sensível e qualificada. Nesse sentido, a singularidade constitui-se como a essência do projeto terapêutico.

Além disso, ainda na dimensão individual, o residente desenvolve atividades de promoção da saúde, prevenção de doenças e agravos, assistência e reabilitação, por meio de atividades individuais e grupais que tem como pressuposto a concepção de Clínica Ampliada. Assim, o processo formativo da residência configura-se como um meio e processo para a construção colaborativa e interprofissional de Projetos Terapêuticos Singulares (PTS), consultas, interconsultas, abordagens em grupos operativos, entre outros.

Essa concepção ampliada do processo saúde-doença e seus determinantes precisa considerar a articulação sinérgica entre saberes técnicos e populares, de maneira que a clínica ampliada se constitui como a diretriz de atuação dos profissionais da saúde.

Na dimensão familiar, o residente vivencia a família em seus contextos de vida e trabalho, a partir de visitas domiciliares, atendimento domiciliar e utilização de ferramentas de abordagem familiar. Neste sentido, atuar em saúde tendo como objeto do cuidado a família é uma forma de reversão do modelo hegemônico voltado à doença, de  modo a ampliar as concepções de cuidado e saúde.

Na dimensão profissional, os residentes vivenciam rodas de categoria, rodas de equipe, vivências teórico-conceituais, vivências no território/serviços de Saúde, grupos de estudo. Com isso, o processo formativo produz tensionamentos e reflexões transformadores, de maneira que a residência se constitui como um processo intenso de educação pelo trabalho e educação permanente, uma vez que os residentes constroem ativamente e ressignificam sua formação a partir da resiliência, comprometimento e envolvimento com os desafios do cotidiano do SUS.

Na dimensão organizacional, os residentes desenvolvem o trabalho em equipe, o planejamento, organização e cogestão, bem como estratégias de discussão de casos e desenvolvimento colaborativo de planos terapêuticos e a definição de fluxos, protocolos, agendas e demais dispositivos ou tecnologias. Neste contexto, a diversidade “(trans)forma” o residente e colabora na construção de competências fundamentais para a colaboração interprofissional.

A dimensão sistêmica, envolve o reconhecimento da relevância da conformação de linhas de cuidado e compartilhamento do cuidado em rede, com vistas a garantir uma atenção integral e longitudinal aos usuários do SUS. Ainda nesta dimensão, são estimuladas a aproximação e a articulação de parcerias intersetoriais.

Na dimensão societária, os residentes precisam desenvolver o processo de reconhecimentos dos recursos, equipamentos e instrumentos disponíveis a partir da imersão nos serviços de saúde e do conhecimento do território vivido

Além disso, a formação da RMS envolve a construção de uma militância e cidadania na defesa da saúde pública, universal e do direito à vida. As diretrizes dos processos de formação para o SUS assentam-se no princípio de que a formação é inseparável dos processos de mudanças.

Considerações Finais:

A formação na RMS envolve o desenvolvimento de competências interprofissionais a partir do encontro de saberes e práticas de núcleos e de campos, onde as múltiplas dimensões individual, familiar, profissional, organizacional, sistêmica e societária da gestão do cuidado são desenvolvidas por meio de significativas vivências, práticas e experimentações no cotidiano do SUS, que ressignificam a formação do residente e qualifica a atenção aos usuários.

Neste sentido, as RMS representam importantes estratégias de formação para o SUS, uma vez que conhecimentos, habilidades e atitudes são desenvolvidos e ressignificados a partir de um movimento sinérgico de envolvimento e mobilização de diferentes categorias profissionais no processo de construção e defesa do SUS.