Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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VALORIZANDO OS SABERES E CONHECIMENTOS TRADICIONAIS DE INDÍGENAS EM CONTEXTO URBANO DE MANAUS: RELATO DA OFICINA DE VALORIZAÇÃO ÉTNICO-CULTURAL NO PARQUE DAS TRIBOS PELO PROJETO MANAÓS/FIOCRUZ
Andréia Santos Cavalcante, Rodrigo Tobias de Sousa Lima, Wanja Socorro Dias Leal

Última alteração: 2022-02-01

Resumo


 

APRESENTAÇÃO: O presente trabalho objetiva apresentar a experiência vivenciada no processo educativo/formativo de promoção à saúde na Comunidade Indígena Parque das Tribos, localizada no bairro Tarumã-Açu, zona Oeste de Manaus, em especial na Oficina Valorizando os saberes e conhecimentos tradicionais: colóquios sobre as vivências e experiências étnico-culturais indígenas. A experiência em tela, integra as ações previstas pelo Projeto Manaós da Fiocruz Manaus, o qual tem como escopo avaliar as condições de saúde da população indígena em contexto urbano e sua capacidade de acesso à rede de serviços de saúde, bem como as demais politicas públicas pelas famílias indígenas da referida Comunidade. Vale destacar que, a escolha do objeto do estudo desenvolvido pelo Projeto, decorre da realidade étnico-cultural de Manaus, considerando que esta abriga em seu manto, grande densidade e diversidade de indígenas originários de distintas regiões do Estado, os quais foram e são, historicamente, atraídos a esta Capital, por melhores condições de sobrevivência econômica e necessidade de acesso às politicas básicas como Educação e Saúde. No entanto, ao chegarem neste espaço, essas pessoas se depararam com diversas dificuldades de acesso aos direitos essenciais, resultantes da fragilidade ou inexistência de politicas de Habitação, Segurança, Educação e Saúde, cenário que se agrava, pela não inclusão dessas famílias, ao Subsistema de Saúde Indígena, coordenado pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI/MS). Embora a Atenção Primária à Saúde (APS) de Manaus, adote importantes estratégias diferenciada de Atenção, cuidado, promoção e recuperação à saúde indígena, estas ainda se mostram insuficientes, diante do exponencial crescimento da presença étnica em contexto urbano da Capital, principalmente em áreas periféricas, marcadas pela ausência ou insuficiência da Rede de serviços públicos e pela grande vulnerabilidade socioambiental, resultado de ações antrópicas próprias de regiões de avanço das fronteiras urbanas. Nesse sentido, visando conhecer as questões que perpassam a realidade dos indígenas em contexto urbano, foi desenvolvido o Projeto Manaós, tendo como locus o Parque das Tribos. Embora na área tenha a presença de não indígenas, a Comunidade constitui-se em território com maior concentração de população indígena da Capital amazonense, abrigando em torno de 2000. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Em termos metodológicos, a atividade consolidou-se como uma pesquisa-ação, sob o viés interventivo e colaborativo, contando desta feita, com a participação direta e dialógica dos próprios sujeitos sociais com a equipe do Projeto. Isso permitiu a captação dinâmica e ativa do percurso percorrido por cada participante até chegar à Comunidade, a identificação das lideranças formais e informais, as lutas, conquistas, tensões e desafios, suas percepções e saberes acerca do processo saúde-doença, bem como as formas e dinâmicas que perpassam o cotidiano das famílias no local. A execução das atividades se pautou na construção de eixos temáticos, contendo, cada um, questões norteadoras que permitiram fomentar o debate, confluindo, sobretudo, para o enriquecimento e o direcionamento das narrativas, bem como para a qualidade das informações coletadas, captando assim, processos de organização sociocultural e política para o acesso aos serviços de saúde e de entender o processo saúde-doença, o itinerário terapêutico, bem como, as práticas e o cuidado em saúde. A Oficina contou com 31 participantes, sendo 20 (vinte) representantes da Comunidadade/etnia e 11 (onze) integrantes do Projeto Manáos e sua programação iniciou com a acolhida aos participantes e as pactuações coletivas de boa convivência. Após, como forma de ‘quebra-gelo’ e integração entre os participantes, ocorreu o ‘Café Compartilhado’, possibilitando a quebra de barreiras ou possíveis constrangimentos pessoais que impedissem o estabelecimento de vínculos, a conformação de grupos e o compartilhamento de saberes. Em seguida, apresentou-se o painel temático ‘Meus caminhos percorridos’. Essa etapa, se configurou a partir de trabalho individual, pautado na seguinte questão norteadora: “O local onde nasci diz muito de mim mesmo/a”,  tornando-se campo fértil para o relato pessoal sobre os caminhos que os trouxeram a Manaus, concorrendo para o surgimento do Parque das Tribos. Esse momento foi enriquecido pelo resgate de fragmentos de memórias, vivências, experiências e significados que cada participante adquiriu ao longo de sua jornada. Por fim, puderam no final avaliar a Oficina, destacando pontos positivos, possíveis fragilidades metodológicas e apontando sugestões de melhoria para os próximos eventos a serem realizados no local pelo Projeto Manaós. Tais resultados, estão norteando a próxima oficina temática, prevista para ocorrer ainda no primeiro trimestre de 2022, tendo por tema “Um olhar para a saúde indígena em contexto urbano e a organização sociocultural, política e das redes de serviços no parque das tribos”. RESULTADOS E/OU IMPACTOS: A Oficina permitiu aos indígenas participantes o protagonismo nas falas, nos relatos sobre as trajetórias pessoais, dificuldades e desafios enfrentados no dia-a-dia da comunidade, além das percepções sobre a realidade do local. As falas reproduzidas pelas lideranças locais e demais participantes suscitaram a discussão acerca da importância da atividade como espaço de reflexão sobre a questão indígena na atual conjuntura, evidenciando suas percepções sobre saúde-doença, formas de autocuidado e solidariedade mútua, no contexto de pandemia provocado pela Covid-19, dificuldades socioeconômicas provocadas pelo isolamento, especialmente pela falta de trabalho remunerado, considerando que grande parte das famílias sobrevivem no mercado informal. Assim, o evento possibilitou a captação de importantes elementos sobre a realidade na comunidade e as possibilidades de fortalecimento da capacidade de pressão sobre o poder público local na efetivação de politicas públicas para o local. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Diante do exposto, é possível evidenciar o papel singular da participação ativa dos moradores em associação e organização de indígenas no local, o que tem contribuído no processo de empoderamento das lideranças indígenas e de luta em prol de melhorias de acesso às políticas e bens públicos. Embora essa diversidade de culturas e de comportamentos também expressem conflitos de interesses e de poder latentes, que denotam elementos limitadores, também elucida potencialidades a serem trabalhadas na coletividade. As políticas públicas, de um modo geral, por implicarem na solução de problemas públicos concernente a uma coletividade ensejam, principalmente, a ação enérgica do Estado em prol do bem-estar da sociedade. Nesse sentido, a política pública desde a sua formação até a execução e avaliação afeta diretamente a vida das pessoas, seja pela ausência ou pela fragilidade da oferta de serviços públicos. Foi possível observar, no entanto, que mesmo diante do atual contexto macro político e econômico brasileiro tão adverso às lutas por direitos e, das tensões naturais que perpassam o tecido sócio-cultural e político do Parque das Tribos, este representa uma importante e efetiva experiência de construção coletiva, de respeito à diversidade, de luta em prol de interesses coletivos e valorização da cultura indígena.