Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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TRABALHO, FUNCIONALIDADE E QUALIDADE DE VIDA DE SERVIDORES MUNICIPAIS DA SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE DE SANTOS/SP
Natália Ferreira Sanches, Thatiane Lopes Valentim Di Paschoale Ostolin, Fernanda Flavia Cockell, Maria Stella Peccin da Silva

Última alteração: 2022-02-06

Resumo


Apresentação: A realização de ações preventivas pressupõe a investigação do trabalho e dos riscos de adoecimento, incluindo contexto de trabalho, exigências físicas, cognitivas e afetivas, vivências e danos em detrimento da avaliação restrita à doença. A ação “Avaliação Ergonômica das Unidades da Secretaria de Meio Ambiente de Santos (SEMAM): uma ação multiprofissional e intersetorial” avalia as condições de trabalho e o impacto na saúde funcional e qualidade de vida dos servidores. Estes servidores trabalham no Orquidário, Jardim Botânico, Aquário e Coordenadoria de Defesa da Vida Animal (CODEVIDA), interagindo com público, animais e plantas. Por isso, faz-se necessário investigar se tais especificidades influenciam o trabalho do servidor e, consequentemente, sua saúde. Portanto, o presente estudo investigou possíveis relações do contexto do trabalho com a funcionalidade e a qualidade de vida dos servidores da SEMAM de Santos, São Paulo, Brasil.

Desenvolvimento do trabalho: Conduzimos estudo transversal com 41 servidores da SEMAM lotados no Orquidário, Aquário, CODEVIDA e Jardim Botânico, independente do tempo de trabalho, cargo, idade ou sexo. Voluntários e estagiários não foram elegíveis, pois são rotativos e periódicos. Os critérios de exclusão foram afastamento ou recusa em participar. Em casos de desvio de funções, os sujeitos foram considerados elegíveis e incluídos no estudo. Cinco instrumentos foram aplicados pela pesquisadora responsável nos postos de trabalho: (1) questionário de avaliação inicial elaborado pela equipe de enfermagem do Departamento de Gestão de Pessoas da Prefeitura de Santos para traçar o perfil sociodemográfico e epidemiológico dos servidores, (2) World Health Organization Disability Assessment Schedule (WHODAS 2.0) para avaliar funcionalidade e incapacidade, (3) Inventário de Trabalho e Riscos de Adoecimento para analisar os riscos de adoecimento das condições de trabalho, (4) Questionário Nórdico de Sintomas Osteomusculares para avaliar a dor nos últimos 7 dias, e (5) World Health Organization Quality of Life (WHOQOL-bref) para avaliar subjetivamente a qualidade de vida. Analisamos descritivamente os dados e apresentamos as variáveis categóricas em frequências e porcentagens, e as variáveis numéricas em média, desvio-padrão, mediana e intervalo interquartil. As associações entre as variáveis categóricas e os escores do WHODAS e WHOQOL-bref foram investigadas através do teste exato de Fisher. Para comparar as variáveis numéricas em relação aos escores do WHODAS e do WHOQOL-bref segundo o posto de trabalho, utilizamos os testes de Kruskal-Wallis e Mann-Whitney.

Resultados: Embora 49 servidores fossem elegíveis, 4 estavam afastados e outros 4 se recusaram a participar. Sendo assim, 41 servidores de meia-idade e ambos os sexos foram incluídos no estudo, sendo 15 trabalhadores do Orquidário, 14 da CODEVIDA, 7 do Aquário e 5 do Jardim Botânico. A maioria dos servidores reside em Santos. Os servidores se autodeclararam brancos (73,2%), pardos (17,1%), amarelos (7,3%) e pretos (2,4%). Os cargos foram veterinário (29,3%), tratador de animais (26,8%), biológo e jardineiro (12,2% cada), auxiliar de veterinário e de serviços gerais (7,3% cada), cozinheira e agente de portaria (2,4% cada). A maioria exerce apenas esta atividade profissional (80,5%) há cerca de 10 anos com regime de trabalho de 6, 8 e acima de 8 horas/dia trabalhadas (26,8%, 63,4% e 9,8% respectivamente) e 48,8% realizam horas extras. Os servidores pegam até 2kg (2,4%), 3kg (4,9%), 5kg (9,8%) e mais do que 5 kg (58,5%), exceto 12,2% que não pegam peso. Cerca de 80% dos servidores apresentaram dor nos últimos 7 dias, mais da metade referiram redução da audição e 17,1%, diminuição da visão. Apesar de apresentarem boa funcionalidade, 31,7% dos servidores usam medicações continuamente. A maioria dos servidores considera a qualidade de vida regular (75,6%), porém 7,3% classificam como ruim e apenas 17,1% como boa. A idade e o tempo de prefeitura não influenciaram na funcionalidade e qualidade de vida, diferentemente das condições de trabalho. Servidores com melhores avaliações na organização do trabalho, relações socioprofissionais e liberdade de expressão apresentaram melhor qualidade de vida. Similarmente, os servidores com incapacidades leves tiveram piores avaliações nos danos sociais e psicológicos relacionados ao trabalho em comparação aos servidores sem incapacidades. A organização e as condições de trabalho mostraram risco crítico e podem estar relacionadas à quantidade de profissionais insuficientes para realizar o trabalho, falta de insumos, descontinuidade do trabalho, mobiliário inadequado, precariedade dos equipamentos, entre outros. O contexto de trabalho apresentou diferenças entre os postos de trabalho. Na CODEVIDA, a organização, condições de trabalho e relações socioprofissionais foram inferiores aos demais postos, o que pode estar associado aos atendimentos clínicos de animais domésticos para tratamento e castrações e as atividades de abrigo de animais abandonados, diferentemente dos outros postos de trabalho que tem como características o cuidar de animais sadios e silvestres. Contudo, trabalhar no Aquário e Jardim Botânico gerou maior custo cognitivo comparado à CODEVIDA, que apresenta trabalho mais operacional com menos imprevistos e cuidado mais repetitivo. No custo cognitivo, as avaliações foram graves, possivelmente pelos parques serem locais com áreas verdes e animais, nos quais imprevistos acontecem com maior frequência, como, por exemplo, chuvas fortes com queda de árvores, comprometimento da vegetação e adoecimento de animais, demandando ações urgentes e por vezes soluções criativas com dispêndio intelectual maior para tomada de decisões e resoluções de problemas. Nas escalas condições de trabalho e custo cognitivo, o Orquidário apresentou avaliações mais positivas que o Aquário e o Jardim Botânico, o que pode estar ligado ao fato de ser um espaço físico adequado e mais confortável com menos ruídos, instrumentos de trabalho suficientes e o dispêndio intelectual menor em relação à tomada de decisões. Em relação ao custo humano do trabalho, o Orquidário apresentou resultados superiores ao Aquário, porém inferiores ao Jardim Botânico. A CODEVIDA e o Aquário geraram maior custo afetivo quando comparados ao Orquidário, o que pode estar relacionado, dentre outros aspectos, à fadiga por compaixão comumente observada em trabalhadores que cuidam de animais. Além disso, os servidores da CODEVIDA avaliaram negativamente a liberdade de expressão.

Considerações finais: Servidores com melhores avaliações na organização do trabalho, relações socioprofissionais e liberdade de expressão apresentaram melhor qualidade de vida, independentemente da idade e do tempo de prefeitura. Similarmente, servidores com incapacidades leves, por sua vez, tiveram piores avaliações em relação a danos sociais e psicológicos do trabalho quando comparados aos sem incapacidades. Sendo assim, quanto mais positivas foram as avaliações da organização do trabalho, das relações socioprofissionais, da liberdade de expressão e dos danos físicos, melhor a percepção da qualidade de vida e maior a funcionalidade do servidor. Possíveis desdobramentos do presente estudo incluem o subsídio de ações para mudanças ambientais e organizacionais nos postos de trabalho associadas ao desenvolvimento e implementação de políticas de promoção, prevenção e proteção da saúde dos servidores.