Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Fortalecendo a Rede de Atenção Psicossocial através da Supervisão Clínico-Institucional nos Centros de Atenção Psicossocial do Rio Grande do Norte: algumas reflexões inaugurais
AMANDA CARLA SILVA CAVALCANTI, Mariana Camila Vieira Fernandes, Eslia Maria Nunes Pinheiro, Marcelle Janine Silva, Geísa Dias Wanderley, Mateus Felipe Otaviano Pedro, Patricia Elizabeth Sanz Alvarez, Maria Márcia de Oliveira Freire

Última alteração: 2022-02-03

Resumo


Apresentação: A portaria nº 1.174, de 07 de julho de 2005, estabelece a Supervisão Clínico-Institucional (SCI) regular como uma ação constituinte do Programa de Qualificação dos Centros de Atenção Psicossociais (CAPS) e a define como o trabalho de um profissional de saúde mental externo ao quadro de profissionais dos CAPS, com comprovada habilitação teórica e prática, que trabalhará junto à equipe do serviço durante pelo menos 3 a 4 horas por semana, no sentido de assessorar, discutir e acompanhar o trabalho realizado pela equipe, o projeto terapêutico do serviço, os projetos terapêuticos individuais dos usuários, as questões institucionais e de gestão do CAPS e outras questões relevantes para a qualidade da atenção realizada. A supervisão se apresenta como um dispositivo importante no contexto da Reforma Psiquiátrica Brasileira, uma vez que tem possibilitado a criação e/ou sustentação de espaços de reflexão em torno das práticas dos serviços substitutivos. Essas reflexões podem levar à qualificação das equipes, fomentando processos de formação continuada e Educação Permanente em Saúde (EPS) - pois o conhecimento é produzido a partir da identificação das dificuldades e das potencialidades vivenciadas em cada serviço e seu território adjacente. Em última análise, esse movimento contribui para apoiar a transição de um modelo de cuidado medicalizante, com ênfase na doença mental, para um modelo psicossocial, que privilegia o sujeito, sua relação com o sofrimento psíquico, seu contexto social e suas singularidades.  No ano de 2021, foi inaugurado o Projeto de Modernização da Rede de Atenção Psicossocial do Estado do Rio Grande do Norte - um acordo de cooperação entre a Secretaria de Saúde Pública do Rio Grande do Norte (SESAP) e a Fundação de Apoio à Pesquisa do Rio Grande do Norte (FAPERN). O processo seletivo simplificado disponibilizou 23 bolsas de supervisão clínico-institucional (SCI) e pesquisa científica de inovação para profissionais formados no ensino superior na saúde e áreas afins. Dessas, 17 vagas foram preenchidas e os Pesquisadores Supervisores foram alocados em três Macrorregiões: A (II, VI e VIII regiões de saúde), B (IV e V regiões de saúde) e C (I, III e VII regiões de saúde). O projeto surge do trabalho de monitoramento da rede de atenção psicossocial (RAPS) realizado pelo Núcleo de Saúde Mental (NUSME) da SESAP/RN com o intuito de responder à desarticulação observada entre os CAPS e os demais dispositivos assistenciais da RAPS, da Rede de Atenção à Saúde (RAS) e das outras redes intersetoriais, bem como à fragmentação dos processos de trabalho, entre outras fragilidades técnicas e institucionais fundamentais para as práticas e cuidados a serem desenvolvidos na atenção psicossocial. O objetivo do presente trabalho é apresentar algumas reflexões iniciais realizadas pela equipe de Pesquisadores Supervisores acerca do processo de implementação da SCI na Rede de Atenção Psicossocial no Rio Grande do Norte (RN), considerando as experiências singulares nas diferentes Macrorregiões e nos diferentes serviços. Desenvolvimento: A experiência iniciou-se em setembro de 2021, com a apresentação dos bolsistas e do Projeto às coordenações dos CAPS em reuniões virtuais por Macrorregião. Em seguida, foram realizados contatos entre supervisor-coordenação para definir dia e horário para a primeira visita presencial. A partir disso, os encontros de supervisão passaram a acontecer quinzenalmente em cada serviço, em horários pactuados com as equipes. Estes cinco primeiros meses de projeto se desenham como a etapa de construção do lugar e do fazer da supervisão clínico-institucional nos serviços, territorialização e elaboração do diagnóstico situacional acerca do processo de trabalho das equipes, organização e funcionamentos das RAPS e demais RAS dos municípios onde os supervisores estão inseridos. Trata-se de um momento de chegada gradativa no serviço, de maneira a permitir o desenvolvimento de um vínculo entre equipe e bolsistas, primordial para o processo de SCI. Para tanto, temos feito uso de ferramentas como a observação-participante no cotidiano dos serviços, encontros no formato de roda de conversa com trabalhadores e gestores, escutas individualizadas com profissionais, consulta aos documentos institucionais relacionados à assistência ao usuário (fichas, formulários, prontuários), elaboração do diário de campo e atas de SCI. Paralela à referida  inserção gradual, também vem sendo realizado um contínuo aprimoramento do referencial teórico-metodológico dos projetos de pesquisa, iniciado a partir da Oficina de Alinhamento Conceitual proposta pelo NUSME/SESAP. Alguns momentos se deram por meio das reuniões semanais e partilha das experiências, que proporcionam o levantar de temas imprescindíveis para a atenção psicossocial. Outrora também foi possível realizar atividades que incentivaram a construção de aportes teóricos que embasam o próprio trabalho de campo, bem como a reformulação do projeto individual de cada bolsista. Destacam-se mesas redondas transmitidas por meio de plataformas virtuais, textos compartilhados entre os membros do projeto e textos utilizados de forma individual na auto organização de cada sujeito. Resultados e/ou impactos: Na prática, os processos de SCI enfrentam uma série de desafios para se estabelecer. Os impasses e as resistências podem apontar questões que precisam ser discutidas e repensadas - desde a micro à macropolítica de cuidado e gestão em saúde (mental). Essas experiências possibilitam sentir as dimensões do afetar e ser afetado a partir de encontros que problematizam os processos de trabalho em saúde. Neste sentido, quando adentramos o campo para processo de reconhecimento entre serviços e supervisores, os discursos surgem como se as práticas estivessem alinhadas e funcionando de forma harmônica, sem questões a serem repensadas ou resolvidas. Com o passar dos encontros, superadas algumas inseguranças e desconstruída a imagem do supervisor enquanto fiscal e possível ameaça, começam a surgir problemáticas vivenciadas no cotidiano, evidenciando fragilidades e necessidades do cenário em que se encontram. É possível perceber práticas solitárias, com dificuldade de articulação em rede, reforçando o paradigma manicomial com o CAPS centrado em processos ambulatoriais específicos. Por outro lado, observamos que à medida que são descortinados conflitos e demandas, há uma expectativa transferida à figura do supervisor no sentido de apontar caminhos que possam solucioná-los. Pelo qual  demarcar o papel da SCI junto às equipes enfatizando o protagonismo dos profissionais está sendo necessário. Diante disso, o espaço da SCI vem sendo sustentado e, através das realidades específicas de cada local, questões estão sendo colocadas em análise com a intenção de produzir conhecimento e transformar os processos de trabalho, à maneira de EPS. Importa destacar que dessa forma são contempladas as dimensões política e clínica do cuidado em saúde mental, contribuindo para fortalecer o modelo de atenção psicossocial. Considerações finais: A SCI desenvolvida a partir do Projeto de Modernização da RAPS no estado do Rio Grande do Norte se encontra num processo de permanente construção e movimento, assim como as próprias práticas do campo de saúde mental no qual ela se insere. A construção do vínculo com os serviços, seus trabalhadores e gestores e outros espaços das redes tem sido o alicerce do trabalho a partir de encontros que produzem saberes e potencializam fazeres em múltiplas direções. Se por um lado os trabalhadores têm a possibilidade de ressignificar seu cotidiano, nós como supervisores também vamos nos entendendo como tais a partir destes encontros. A precarização das relações de trabalho e o desmonte da Política Nacional de Saúde Mental são limitações que se colocam tanto para a prática da SCI quanto para o trabalho na rede como um todo. Ainda assim, apostamos na supervisão como um dispositivo de resistência e de respiro.