Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
Tamanho da fonte: 
Quem cuida de quem cuida?: relação intersetorial no Programa Saúde na Escola através de experiência com os/as professores/as durante pandemia da COVID-19
Sofia Lopes Piccinini, Carine da Fontoura Fernandes, Daniele da Silva Lacerda, Juliane Viero Feldman, Lucia Helena Donini Souto

Última alteração: 2022-02-03

Resumo


Dentre os desafios despertados pela pandemia da COVID-19, em um contexto de retrocessos das políticas sociais e acirramento das desigualdades, destacamos o período vivenciado pelas crianças e jovens que estiveram sem acesso à escola presencialmente. Nesse contexto, intensificaram-se as disparidades sociais, raciais e locais e possíveis consequências nos processos de ensino-aprendizagem e de saúde mental de estudantes, famílias e professoras/es. Paralelamente a isso, em decorrência da pandemia e da precarização, houve uma diminuição das ações de promoção e prevenção em saúde por parte das equipes de saúde da Atenção Básica, frente ao cenário de enfrentamento ao Coronavírus. Em virtude de a pandemia da COVID-19 estar se prolongando, a partir do segundo semestre de 2021, algumas atividades de promoção e prevenção em saúde híbridas, presenciais e online, retornaram no município de Porto Alegre; dentre elas, o Programa Saúde na Escola (PSE). Neste trabalho, objetiva-se compartilhar a experiência de educação em saúde do PSE vivenciada por uma equipe de saúde da Atenção Básica, localizada na Zona Norte do município de Porto Alegre, em meio à pandemia, e evidenciar a importância das ações de promoção e prevenção, principalmente envolvendo a intersetorialidade, apontando para o cuidado “com quem cuida” entre profissionais de saúde e professoras/es. A equipe de saúde referida atua em um território em que existem três escolas: uma escola conveniada com o município de educação infantil; uma escola estadual de ensino fundamental; e uma escola estadual de ensino fundamental e médio. Ainda que a equipe tenha iniciado ações por meio do PSE com as três escolas, este trabalho versa sobre a experiência de aproximação com o grupo de professoras/es da escola de ensino fundamental e médio (que abarca em torno de 2000 estudantes). No que se refere às demais experiências, nas outras escolas, também ocorreram aproximações junto às professoras/es, assim como foram realizadas ações com as/os estudantes, buscando abordar os temas que se relacionavam com o atual cenário pandêmico, mas também com a realidade da comunidade escolar e suas necessidades. Considerando que o PSE tem como objetivo principal promover ações de promoção de saúde por meio da articulação entre os setores Saúde e Educação, visando o cuidado e a educação integrais, a experiência de intervenção da equipe, na referida escola, teve como início a ação-intervenção com as/os professoras/es, entendendo-as/os como quem já estava diretamente vivenciando o retorno às aulas presenciais e híbridas e quem havia vivenciado o ensino remoto/online, com todas as precariedades que envolveram essa mudança tanto para estudantes quanto para professoras/es. A partir disso, optou-se por iniciar o trabalho do PSE com professoras/es como uma forma de construir “multiplicadores” nas ações-intervenções, tendo em vista que o  contexto da pandemia dificultou realizar ações com todas/os as/os estudantes da escola. Além disso, o trabalho com as/os professoras/es permitiu a possibilidade de construir processos de co-responsabilidade do cuidado a partir da intersetorialidade, vislumbrando a potência de construção conjunta com essas/es profissionais. Dessa forma, foi pensada a intervenção-ação com professoras/es de modo a promover uma escuta aberta e ampliada daquilo que pudessem trazer como demandas para as/os profissionais de saúde envolvidos com o PSE, enquanto equipe de saúde. Diante das demandas apresentadas, podemos elencar três funções exercidas pela equipe na intervenção proposta: uma função técnico-pedagógica, em um sentido de educação permanente, a partir de temáticas elencadas pelo grupo a serem trabalhadas com o próprio grupo (como por exemplo identidade de gênero e orientação sexual, relação da escola com as famílias, violências e saúde mental de estudantes e professoras/es); uma função terapêutica, tendo em vista o que produz em termos de saúde o processo de falar, ser escutada/o e compartilhar experiências, ao falar sobre si e sobre vivências da docência e dificuldades; e uma função de planejamento das ações do PSE para 2022, com previsão de ocorrer junto às/aos estudantes, a partir de temáticas, problemáticas e questões que as/os trabalhadoras/es entendem como importantes de serem abordadas com os/as estudantes. A ação-intervenção foi dividida em quatro encontros possibilitando a circulação da fala, a escuta mútua entre as/os próprias/os professoras/es, o compartilhamento de intervenções artísticas e a construção de demandas conjuntas. Teve como disparadora a pergunta aberta de “Como foram os efeitos da pandemia da COVID-19 em sua vida?”, juntamente com um convite para que trouxessem alguma manifestação artística que remetesse a essa vivência. Diante da articulação e aproximação que vem sendo construída,  percebemos que, durante os encontros, havia satisfação e participação ativa por parte do grupo de professoras/es ao participarem da intervenção-ação. Também, destaca-se a abertura do espaço para que educadoras/es pudessem partilhar suas questões, que, por vezes, eram relacionadas ao que presenciavam de questões das/os estudantes e não sabiam como intervir, além de  questões que lhes atravessavam pessoalmente enquanto sujeitos. Indo ao encontro do título deste relato de experiência, “Quem cuida de quem cuida?”, entende-se que o resultado dessa vivência - que envolveu a retomada de uma ação de educação em saúde intersetorial - foi a possibilidade de abrir para um encontro sensível entre profissionais de saúde e professoras/es, ao escutar a categoria, em um tempo histórico de desvalorização do ato de educar e atravessado pelos processos precarizantes das políticas públicas, destacando aqui a política de educação. Foram perceptíveis os efeitos de trabalhar com as/os professoras/es, tanto na perspectiva de serem multiplicadores daquilo que é abordado com grande parte de seus estudantes, quanto na ideia de que são eles e elas que estão diariamente com os/as estudantes e, portanto, muitas das angústias, preocupações, dúvidas, recaem sobre si próprios/as - os quais, percebeu-se, não tinham espaço de escuta e trocas acerca das questões que lhes afetam. Por fim, com o trabalho, ficou nítida a importância do investimento em ações de promoção e prevenção em saúde, pensadas a partir de uma dimensão ampliada em saúde, incluída aqui a importância das ações intersetoriais e do cuidado em saúde com professoras/es, como uma forma de “cuidado com quem cuida”.