Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Constituição de um Movimento Impulsionador Antimanicomial em um Contexto de Manicomialização no Estado do Ceará
Francisco Anderson Carvalho de Lima, José William Crispim Alves, Núbia Dias Costa Caetano, Nelson Estevão de Oliveira Santos, Claudia Freitas de Oliveira, Alexsandro Batista de Alencar, Ronaldo Rodrigues Pires, Gicelia Almeida da Silva, Olga Damasceno Nogueira de Sousa

Última alteração: 2022-02-02

Resumo


A Reforma Psiquiátrica Brasileira (RPB) alinha-se à Luta Antimanicomial no delineamento de uma Política Nacional de Saúde Mental sob a égide dos Direitos Humanos. Vinha desenhando-se a inscrição de uma ação pública em saúde mental na implementação do modelo de atenção psicossocial em detrimento do modelo asilar. O estado do Ceará apresenta pioneirismo no desenvolvimento e implementação de legislação antimanicomial com a Lei Estadual n° 12.151, de 29 de julho de 1993, que dispõe sobre a extinção progressiva dos Hospitais Psiquiátricos e sua substituição por outros recursos assistenciais, regulamenta a internação psiquiátrica compulsória, e dá outras providências. Bem como, inicia a implantação e o desenvolvimento de serviços de atenção psicossocial e comunitária também de forma pioneira. Contudo, na esteira do movimento de remanicomialização da política de saúde mental ensejada no Brasil a partir de 2011 com a inclusão das Comunidades Terapêuticas (CTs) na Rede de Atenção Psicossocial e o agravamento deste processo com a reinserção da centralidade dos Hospitais Psiquiátricos Especializados (HPE) na política, crescente financiamento de leitos de internação em CTs e revogação dos preceitos da RPB por meio de instrumentos diversos, o estado do Ceará vem apresentando um crescente caráter manicomial com relação ao papel estadual na ação pública em saúde mental. Em termos de financiamento, o estado aplica recursos somente em serviços do modelo asilar de saúde mental, deixando os serviços de atenção psicossocial a cargo dos municípios e do governo federal, quais sejam: R$700 mil anuais para internações em nove CTs e cerca de R$13 milhões mensais para um HPE estadual, o Hospital Mental de Messejana, manicômio que figura no Relatório de Inspeção Nacional dos Hospitais Psiquiátricos no Brasil com uma série de violações graves, fora as constantes denúncias de violações de direitos e o fato de três óbitos de pacientes internados somente no ano de 2021. Além disso, é crescente a manicomialização no território estadual, em que, apesar da legislação, é frequente a abertura de clínicas psiquiátricas asilares de toda ordem sem a devida fiscalização, as quais são alvos de denúncias criminais diversas. Neste contexto, ganhou repercussão nacional o caso da Casa de Acolhimento Água Viva, na qual cerca de 35 mulheres, algumas acometidas com transtornos mentais, eram vítimas de cárcere, tortura e violência sexual, e o projeto de construção de um Hospital Psiquiátrico, ambos no município de Crato, no cariri cearense. Vale ressaltar que a Luta Antimanicomial engendra um horizonte ético anticapitalista, antirracista, antissexista e abolicionista, a fim de superar o modelo manicomial. Neste sentido, por meio de articulações entre movimentos sociais antimanicomiais, feministas, abolicionistas e antirracistas, conselhos de saúde e entidades do controle social, o Fórum Cearense da Luta Antimanicomial organizou um movimento impulsionador antimanicomial ampliando o campo da participação popular. Neste relato, apresentaremos algumas das experiências deste movimento, tais como a missão de direitos humanos realizada no cariri cearense junto ao Conselho Nacional de Direitos Humanos, os trabalhos para a construção da Política Popular de Saúde Mental e as movimentações para impedir a construção do hospital no Crato, dentre outras.