Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Desafios à integralidade do cuidado às mulheres com deficiência na Atenção Básica
Francine Souza Dias, Anahí Guedes Mello

Última alteração: 2022-02-03

Resumo


As pessoas com deficiência conquistaram o direito à saúde no final da década de 1980. Apesar disso, somente a partir dos anos 2000 que as especificidades de gênero receberam atenção no debate sanitário. Ao longo da história, os cuidados especializados foram prioritariamente enfatizados, posto que a ideia da habilitação/reabilitação como recurso principal de promoção da autonomia e independência implicou prioridades políticas e orçamentárias. O direcionamento das pessoas com deficiência para serviços reabilitacionais, a despeito de suas demandas de cuidados primários, prolongou a invisibilidade da assistência a esse público nesse nível de atenção e prejudicou a diligência às especificidades de gênero. O próprio foco na funcionalidade reduzia o sujeito a membros e funções, produzindo iniquidades diversas. Neste trabalho, dedicaremo-nos, em especial, àquelas que afetam as mulheres com deficiência (McD).

Enquanto a Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência (2002) não avançou em relação a essas peculiaridades, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (2004) favoreceu o debate. Mobilizadas por essa agenda e pela escassez de produção teórica sobre o tema, propomo-nos a realizar um breve panorama do estado da arte do cuidado às McD na Atenção Básica em saúde (AB), área que constitui um dos componentes da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência. A partir de uma revisão  da literatura, baseada em levantamento bibliográfico realizado na Biblioteca Virtual de Saúde, categorizamos os principais desafios ao cuidado integral das McD, entre os quais destacamos: a escassez de ações de planejamento familiar, orientação e acompanhamento quanto à saúde sexual e reprodutiva nos diferentes ciclos da vida; as barreiras no agendamento e realização de consultas e exames ginecológicos; a negação de assistência materno-infantil humanizada e desqualificação do papel do cuidado exercido por McD; e a sugestão de risco gestacional exclusivamente pelo fato de ser McD, quando o cuidado é interrompido na AB.

Ainda, observamos que esses limites são favorecidos e reiterados diante de outras dimensões macropolíticas, tais como: negação da autonomia da McD sobre seu corpo, sexualidade e tomada de decisão; falta de acessibilidade arquitetônica e comunicacional nos equipamentos; falta de acessibilidade urbanística e nos transportes do território; e predominância de uma abordagem biomédica da deficiência nos serviços de saúde.

O estudo aponta que o capacitismo opera em todas as dimensões do cuidado às McD, instituindo barreiras à efetivação dos princípios do SUS – integralidade, equidade e integralidade – e balizando frequentes episódios de violência de gênero nos serviços de saúde. Como categoria macropolítica que atravessa e constitui práticas de saúde, o capacitismo inviabiliza o cumprimento dos papeis preventivo, protetivo e de recuperação da Atenção Básica, colocando as McD em situação de especial vulnerabilização social. Acreditamos que as novas mobilizações políticas de McD no cenário nacional e a ampliação desse debate nos espaços formativos e na produção técnico-científica da saúde podem contribuir com a modificação dessa realidade, renovando a luta contra os ataques sofridos em tempos de ofensivas neoliberais e ampliação dos microfascismos  institucionalizados  nas diferentes políticas sociais.