Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Formação prática do sanitarista no ensino remoto emergencial: um relato de experiência
Analia Samanta López

Última alteração: 2022-02-04

Resumo


As estratégias de ensino-aprendizagem no ensino superior que proporcionam experiências oportunas de reflexão, integração e aplicação de conhecimentos, precisaram ser reinventadas durante a pandemia.  O curso de graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal de Integração Latinoamerica  enfrentou esse desafio com turmas de alunos espalhados no Brasil e no exterior, considerando o cenário político e organizacional de sistemas de saúde e realidades sociais distintas. Mas apesar de todos os entraves foi possível desenvolver ações educacionais que integrassem a teoria e a prática, a fim de proporcionar aos estudantes vivências em promoção a saúde voltadas para saúde mental.

Objetivo: Este estudo busca descrever a experiência vivenciada a partir da realização de trabalho de campo para mapeamento de ações inovadoras de promoção de saúde mental na Cidade de Córdoba- Argentina.

Descrição da experiência: A ementa da disciplina Práticas Interdisciplinares V, do Curso de Bacharelado em Saúde Coletiva da UNILA concentra-se nas políticas de promoção da saúde como instrumentos potencializadores da atenção primária e visa proporcionar aos alunos a compreensão da interdisciplinaridade entre diversos temas e eixos da matriz curricular do curso, tendo a realidade local como campo de observação e atuação. Para atingir este objetivo, a docente que ministrou a disciplina propôs o trabalho de campo como metodologia de ensino e a entrevista como principal estratégia.

Inicialmente, os alunos participamos de forma ativa na etapa pré-campo destinada ao planejamento desta atividade, cada um realizou uma pesquisa e análise da principal política ou programa nacional de saúde mental do país de residência atual e posteriormente um levantamento dos estabelecimentos, mais próximos a nossa localização, que funcionam como porta de entrada do usuário ao sistema de saúde público. A seguir, construiu-se coletivamente um roteiro de perguntas para entrevista semiestruturada e a professora ministrou orientações sobre entrada ao campo, o uso do caderno de campo, e foram repassadas as medidas de segurança pessoal e de autocuidado para evitar o contágio pela COVID-19.

No dia 27 de Julho pela manhã, uma das experiências de trabalho de campo desenvolveu-se na zona Sul da Cidade de Córdoba- Argentina, visitando diferentes Centros Municipais de Saúde. No primeiro e segundo posto de saúde, o gestor relatou que não eram desenvolvidas ações de promoção da saúde mental e, inclusive, não existia o serviço de psicologia. O terceiro local visitado realizava atendimento à saúde mental por agendamento e de forma individual mas não desenvolvia estratégias de promoção. A profissional entrevistada esclareceu que  apesar de esse centro ser identificado como parte do Programa de Equipes Comunitárias (PEC), que visa consolidar a atenção básica no país, através da proteção e promoção de saúde, não existe uma verdadeira equipe devido à falta de investimentos para contratação de profissionais. No entanto, o relato da profissional trouxe maior clareza sobre a inclusão da promoção na Política Nacional de Saúde Mental, sua implementação no nível local e forneceu dados importantes para o mapeamento das ações de promoção na zona sul, o que motivou a extensão do trabalho de campo para a Casa Comunitária de Saúde Mental do bairro "Villa Libertador" com estratégias inovadoras. Neste último estabelecimento, foram encontrados cartazes com informações sobre diversas oficinas abertas à comunidade presenciais e virtuais e observou-se um local denominado “Mercadinho Popular” que oferecia serviços e produtos artesanais à venda, o responsável pelo espaço, integrante da comunidade, relatou que os produtos são confeccionados por grupos de usuários do serviço de saúde mental, majoritariamente por pessoas em reabilitação por adições e mulheres em acompanhamento por situações de violência doméstica, que desse modo podem garantir coletivamente a sua alimentação. Outro entrevistado destacou o compromisso dos profissionais que orientam o desenvolvimento de cada um dos empreendimentos e a relevância do mercadinho principalmente como um espaço onde se criam novos laços, amizades e redes de apoio necessárias para a construção dos novos projetos de vida das pessoas que procuram uma transformação. Na etapa pós-campo, realizou-se uma análise das informações obtidas durante a atividade de campo de forma individual e coletiva, fazendo o compartilhamento de reflexões sobre as experiências vivenciadas pela turma nos diferentes cenários e comparando com as estratégias do SUS. A etapa final foi voltada à elaboração de um relatório final.

 

Impactos: Após a experiência de campo verificou-se que a principal resposta ante qualquer demanda em relação à saúde mental é o atendimento individualizado ou encaminhamento aos centros de maior complexidade. O Estado destina a maior parte de seus recursos orçamentários aos centros psiquiátricos e reduz sistematicamente os recursos destinados à promoção da saúde mental comunitária, refletido no número limitado de profissionais de saúde responsáveis ​​por grandes áreas programáticas ou na ausência completa de dispositivos comunitários que possam acompanhar o desenvolvimento de estilos de vida saudáveis. Por outro lado, o caso do “Mercadito Popular” como ação inovadora oferece a oportunidade de refletir sobre a importância dos determinantes da saúde, pois a promoção da saúde engloba não apenas ações voltadas diretamente para o aumento das habilidades das pessoas, mas também para modificar as condições sociais, ambientais e econômicas.

 

Considerações finais: A forma didática com a qual a disciplina  foi proposta garantiu o desenvolvimento de habilidades importantes para a formação do Bacharel em Saúde Coletiva, como autonomia, competências socioemocionais, engajamento e iniciativa na aquisição de conhecimento. As possibilidades de intercâmbio com nossos pares foi fundamental para que uma aprendizagem autônoma não se transforme em uma experiência isolada, e seja significativa para aquisição de novas competências. A atividade também tornou-se essencial para a construção do pensamento crítico-reflexivo sobre a importância da promoção em saúde e foi possível identificar as contribuições de diversas disciplinas da formação dos acadêmicos de Saúde Coletiva como Avaliação em Saúde, Comunicação e Educação em Saúde, e Políticas, Planejamento e Gestão em Saúde imprescindibles para a atuação na formulação e organização de estratégias. A experiência permitiu valorizar a mudança da política de saúde mental, do paradigma que trabalha sobre a doença, para dar lugar a intervenções inovadoras como as observadas no Centro Comunitario de Saude Mental de “V° El Libertador”; mas também possibilitou reconhecer a fragilidade da atenção básica em relação ao atendimento à saúde mental. Assim, pode-se perceber a importância do papel dos sanitaristas como sujeitos capazes de contribuir para a efetivação das ações de promoção de saúde, tanto no processo de planejamento, intervenção e avaliação das estratégias quanto na gestão de um sistema de saúde e serviços que incluíam ela.