Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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AS DIVERSAS FACES DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE SÃO POSSÍVEIS OU UTÓPICAS? A EXPERIÊNCIA DO IV FÓRUM BAIANO DE ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
João André Santos de Oliveira, Rafaela Cordeiro Freire, Andherson Sthépheson Barberino Damasceno, Vinícius Pereira de Carvalho, Ledylane Azevedo Moraes, Leila Cristina da Silva Costa, Bruna Helena Ribeiro Araújo dos Santos, Raianne Bárbara Martins Soares da Silva

Última alteração: 2022-02-04

Resumo


Trata-se de um relato de experiência do IV Fórum Baiano de Atenção Primária à Saúde, promovido pela Liga de Atenção Primária à Saúde da Universidade Federal da Bahia (LAPS/UFBA), nos dias 27 e 28 de janeiro de 2022. Este trabalho objetiva apresentar as atividades realizadas durante o evento, bem como apontar os seus resultados e os efeitos produzidos.

A quarta edição do Fórum, que contou com a temática: “As diversas faces da Atenção Primária à Saúde - possíveis ou utópicas?”, discutiu as múltiplas realidades dos serviços de saúde e das condições de vida da população. Além disso, possibilitou o debate sobre os possíveis caminhos para construção e fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Atenção Primária à Saúde (APS). Desse modo, trouxe consigo não somente as sementes plantadas nas edições dos fóruns anteriores, mas também o desejo forte e urgente da LAPS em construir um espaço acessível, inclusivo, integrativo e que rompesse as barreiras criadas pela pandemia da COVID-19, com vistas a abrir mais caminhos para debater a APS e juntar forças na luta política pela efetivação do SUS democrático, público, gratuito, universal, de qualidade e com integralidade no cuidado e na atenção à saúde.

Por questões sanitárias relacionadas à pandemia, o evento ocorreu na modalidade on-line, tendo sido realizada a transmissão de duas conferências e quatro mesas de debate através do YouTube, pelo canal da Liga, caracterizando o livre acesso a esses espaços. Os vídeos disponibilizados no canal “LAPS UFBA” somaram, ao fim de janeiro de 2022, 4.408 visualizações. Além desses espaços publicizados e públicos na rede virtual, ocorreram 17 salas de apresentações de trabalhos e seis oficinas, as quais foram realizadas por meio da plataforma Google Meet. Ao todo, o Fórum contou com 777 pessoas inscritas, de 17 estados, com 167 trabalhos acadêmico-científicos e artístico-culturais submetidos e avaliados pela Comissão Científica. Essa Comissão foi formada por pessoas docentes e pesquisadoras de diferentes instituições brasileiras de ensino e serviços de saúde.

A audiência nas mesas e conferências ao vivo flutuou entre 70 e 100 indivíduos assistindo simultaneamente. Ademais, as e os participantes se distribuíram nas salas de oficinas e de apresentações de trabalho, variando em torno de 20 a 50 por ambiente. Nas mesas e conferências, as pessoas debatedoras efetuaram audiodescrição e houve tradução simultânea em Português-Língua Brasileira de Sinais, realizada pela equipe de tradutores-intérpretes do Núcleo de Apoio à Inclusão do Aluno com Necessidades Educacionais Especiais da UFBA. O suporte tecnológico e administrativo foi fornecido a partir da Superintendência de Tecnologia da Informação e do Sistema de Gerência de Eventos desta Universidade, com o auxílio de pessoas monitoras, ligantes da LAPS e Comissão Organizadora.

O evento contou com um ato de abertura, iniciado ao som dos Alagbês, com saudação aos 75 anos da UFBA e subsequente abertura dos caminhos. A partir de cada espaço, computador, tablet ou celular, entre outros dispositivos, a palavra utopia foi sonorizada, reverberando a UNIVERSIDADE PÚBLICA, GRATUITA, INCLUSIVA E DE QUALIDADE, num país democrático e com um SUS forte. A conferência de abertura, após esse ato simbólico, acendeu o alerta para as diversas faces da APS, onde "cada um é um mundo" (Altério e Viáfora) – singular, complexo, simples, diverso, amplo e poético –, e o debate que se seguiu na primeira mesa afirmou que a “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo” (Paulo Freire), como nossos encantados não nos deixam esquecer. Sob a inspiração da memória destas pessoas, as pesquisas, os relatos, os ensaios e as experiências foram expostos em salas cujos nomes simbolizam o mais profundo respeito e gratidão. Foram elas: Fran Demétrio, Simone Leite, Milton Santos, Maria Odília Teixeira, Marlon Araújo Pires, Juliano Moreira, Sebastião Loureiro, Victor Valla, Paulo Freire, Nise da Silveira e todas as Meninas e Meninos Joel perdidos pela injustiça racial e violência de Estado.

As apresentações e discussões em torno dos trabalhos também foram realizadas mobilizando afetos, inteligências e capacidades, inspiradas pela presença de pessoas marcantes para a construção cotidiana do SUS, como Diana Brasil Sampaio, Mônica Calazans, Dina Czeresnia, Vera Formigli, Áureo Augusto e Edna Maria de Araújo. O conhecimento compartilhado e a presença dessas pessoas entre nós, sem dúvida, ajuda-nos a caminhar neste “Mundo tão desigual, [onde] tudo é tão desigual” (Gilberto Gil), como foi denominada outra mesa de debate. Destacamos que nessa atividade não conseguimos garantir a presença de representantes de povos originários, por meio de falas, mas deixamos nosso agradecimento a cada pessoa indígena que comemorou e agradeceu o convite. Reconhecemos mais esta como uma das grandes dívidas com vocês.

Em consonância, as oficinas propostas pelo evento criaram oportunidades de conhecer melhor o ofício de quem se dedica a cuidar no SUS e a construí-lo, através de diferentes temáticas, sendo elas: ‘‘Redução de Danos na Atenção Primária à Saúde’’, ‘‘Escuta sensível pela dinâmica dos sentidos orgânicos’’, ‘‘Cuidando da saúde mental na Atenção Primária: instrumentalizações possíveis’’, “HIV/Aids na Atenção Primária à Saúde", ‘‘Sua Consulta Tem Cor?’’ e “Residências multi: o que precisamos saber?’’.

Somaram-se às oficinas, debates que demarcaram a diversidade de saberes e práticas de saúde com enfoque na multidimensionalidade dos processos de saúde-adoecimento-cuidado. Nesse sentido, as Práticas Integrativas e Complementares e a articulação entre as diferentes tecnologias na produção do cuidado, pensando também na descolonização de seres, saberes e fazeres no âmbito da APS, estiveram presentes na forma de “Livros, discos, vídeos à mancheia e deixa que digam, que pensem, que falem” (Caetano Veloso), título da segunda mesa de debate. Para além disso, se “Pr'esse canto do mundo’’, o território e o meio ambiente, enquanto determinantes sociais de saúde e locais de produção da vida no contexto da APS, da contemporaneidade e do mundo globalizado, encontram-se presentes, questionamos de forma desafiadora na última mesa de debate ‘‘Quando [e se] virá o amor?” (Caetano Veloso).

Assim como os caminhos foram abertos, houve a necessidade de fechá-los, ao menos oficialmente e momentaneamente. Para tanto, o ato de despedida e a Conferência de fechamento deixaram no ar aquela inquietação preconizada ao longo do IV Fórum Baiano de APS: as diversas faces da APS, afinal, são possíveis ou utópicas, mediante o panorama político, econômico e social do país?

Diante de tudo isso, fica evidente: o que vivemos foi muito mais que um fórum. Foram inúmeros encontros plurais, diversos, inclusivos, potentes e produtores de mais vida nas muitas vidas em produção. Mais vida, inclusive, no que construímos como “vida acadêmica” e suas possibilidades. Com arte, poesia e muito diálogo, o IV Fórum Baiano de Atenção Primária à Saúde mostrou-se potente como espaço de construção de (re)existências, utopias e insurgências nesses tempos de redução do financiamento, desmonte e precarização da APS e do SUS pelos quais estamos passando no Brasil.