Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida
v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Última alteração: 2022-03-02
Resumo
O Projeto Niterói é resultado de uma ação coletiva, a partir da experiência de extensão universitária (popular) na perspectiva de produção de cuidado de crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade e um grupo de trabalhadores inseridos na Atenção Psicossocial Infanto-juvenil da cidade, constituindo-se a partir do projeto de extensão “Criança e adolescente em situação de rua e acolhimento institucional: construindo estratégias de territorialização afetiva” para desenvolver ações no território visando a produção de acesso à saúde e qualificação do acolhimento e escuta das demandas desses sujeitos. O projeto está vinculado ao Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da UFF em Niterói, com integração de estudantes de graduação (medicina, serviço social, psicologia e nutrição) e pós-graduação (saúde coletiva, geografia, educação e sociologia), professores e técnicos do ISC e do Instituto de Nutrição e, conta com a parceria da ERIJAD (Equipe de Referência Infanto–Juvenil para ações de atenção ao uso de Álcool e outras Drogas) e da ONG Bem-TV .
O Projeto Niterói ancora-se no tripé ensino, pesquisa e extensão busca enfrentar o agravamento das situações de vulnerabilidade e ser um potencializador do acesso da população infanto-juvenil em situação de vulnerabilidade aos serviços essenciais, ao cuidado e a proteção social, buscando dar visibilidade aos impasses identificados nas redes socioassistenciais, fomentar experiência de redes intersetoriais territorializadas na direção da descentralização e capilaridade e, sensibilizar a população em geral sobre a importância de Uma cidade inteira para cuidar de suas crianças/adolescentes e jovens. Como estratégia metodológica de investigação, educação e intervenção o projeto orienta-se pela pesquisa-ação (PA), visando à transformação de uma determinada realidade, neste caso, dos meninos e meninas em situação de rua e/ ou vulnerabilidade. A PA lança mão de variadas técnicas, em seus diferentes momentos ou processos de investigação, para “coletar e interpretar dados, resolver problemas, organizar ações, etc” (THIOLLENT, 1986, p.25), ao mesmo tempo em que colabora para a construção coletiva do conhecimento entre pesquisadores e grupos envolvidos.
Para o desenvolvimento do projeto, três linhas de ação se articulam, processualmente, por meio dos princípios éticos, políticos e pedagógicos da Educação Popular e da Extensão Universitária, sendo elas: (linha de ação 1) a produção e disseminação de informação por meio de um diagnóstico situacional sobre as políticas públicas municipais para a população infanto-juvenil, as percepções e práticas de diferentes atores sociais nos serviços e conselhos de tutelares e, as vivências de crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade e/ou rua; (linha de ação 2) a formação/educação permanente/capacitação de trabalhadores sociais que atuam no Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente; (linha de ação 3) e, as ações extensionistas de incidência política e produção de acesso nos territórios. Essas ações no território, dentro da experiência pregressa do grupo de pesquisadores, estudantes e trabalhadores iniciada entre 2016 e formalizada em 2017, foi nomeada “Ocupa Praça”.
O Ocupa Praça, com delicadeza e com muita articulação intersetorial, ocupa assim terrenos, praças, becos, ruas, lugares de grande circulação e reconhecimento de crianças, adolescentes e jovens que têm esses espaços públicos como locais de vida, afeto e moradia, acreditando no território por eles usado, ou seja, “todo complexo onde se tece uma trama de relações complementares e conflitantes” (SANTOS, 2000, p.12), como alternativa de cuidado em saúde afetiva, participativa e democrática. Essa intervenção, devido às restrições vindas da COVID-19, não ocorreu no ano de 2020, mas foi retomada em dezembro de 2021, envolvendo novos atores e parcerias, visto a nova realidade social que precarizou ainda mais a vida da população, já desde antes tão vulnerabilizada.
No que se refere às linhas de ação 2 e 3 ressalta-se que, na interface da construção de um modo de ação coletiva que potencialize a reflexão e problematização na pesquisa-ação, existe também a demanda por um processo pedagógico para a mobilização, integração e coletivização de conhecimentos, atitudes e práticas dos participantes, o que vem se dando por meio de um processo de formação/ capacitação participativa que articula rodas de conversa, eventos de extensão e círculos de cultura orientados pela Pedagogia Freireana para reflexão-ação coletiva junto aos atores públicos de diferentes áreas, o que vem colaborando para a qualificação da assistência promovida pelos serviços essenciais para a população alvo das ações do projeto.
Entre as diversas atividades formativas, vale registrar que foram realizados em 2021: oito (08) Encontros de Formação /capacitação da equipe abertos a convidados da rede; dez (10 ) Grupos de estudos abertos a convidados da rede (ECONEXA); quatorze (14) Rodas de Conversas com a rede/ SGD “Cuidados para infância, adolescentes e jovens”, em parceria com a equipe ERIJAD; três (03) encontros de extensão para sensibilização e atualização da comunidade acadêmica e da sociedade civil assim intitulados: “De quem é o Bebê”; "Violências e saúde mental infanto-juvenil – 18 de maio: um dia, muitas lutas!”; e, “Segurança alimentar para crianças, adolescentes, jovens e famílias em situação de vulnerabilidade e/ou rua: avanços e desafios” .
A linha de ação 3, dedicada à incidência política e atuação territorial, tanto apoia diretamente, via parceira interinstitucional formalizada com a ERIJAD, trabalhadores/as que atuam na perspectiva da redução de danos com crianças, adolescentes e jovens em cenas de uso, como também, indiretamente, aqueles que, intersetorialmente integram dispositivos do Sistema de Garantia de Direitos (SGD), entre os quais o Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (CAPSI) representando a Saúde, as Instituições de Acolhimento Institucional e o Programa de Erradicação do Trabalho pela Assistência Social e, pela Cultura, a Biblioteca Parque Estadual. Ainda nessa linha de ação, ocorre a participação dos pesquisadores e estudantes nas reuniões do Fórum de Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA) e Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).
Além dos trabalhadores sociais atuantes na rede, o projeto vem colaborando para a formação diferenciada de alunos/as de diferentes cursos de graduação e pós-graduação, contando com um rico e permanente processo de reflexão-ação-reflexão, o qual contribui para um olhar ampliado, intersetorial e interdisciplinar sobre o cuidado em saúde, a educação integral, os direitos sociais e o território, apostas conceituais e políticas necessárias à uma prática transformadora, situada na realidade e potente no enfrentamento dos problemas estruturais que, historicamente vulnerabilizam crianças e famílias em situação de pobreza, entre os quais o racismo. Atualmente, pela linha 1, o projeto tem se dedicado a produzir um diagnóstico situacional das políticas públicas do município de Niterói, referente ao período entre 2015 e 2019/2020, buscando destacar as políticas públicas já implementadas, seus resultados e sua geolocalização, a fim de oferecer um cenário panorâmico do município e contribuir para os projetos/ações e estratégias.