Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Quem escuta o sofrimento da mulher? O plantão psicológico remoto enquanto dispositivo de acolhimento a mulheres na pandemia.
PATRICIA MASCARENHAS PASSOS, Rosana dos Santos Silva, Rafael Sousa de Brito

Última alteração: 2022-02-23

Resumo


As desigualdades de gênero são fatores preponderantes no que permeia o acesso de mulheres aos dispositivos do Sistema Único de Saúde (SUS). Eleitas enquanto cuidadoras e imersas nos diversos papéis sociais impostos, encontram-se muitas vezes em situação de maior vulnerabilidade e com prejuízos no autocuidado. Neste cenário, a pandemia da COVID-19 colocou em evidência que a há diferenças no modo como os grupos sociais são afetados por essa emergência sanitária, o que chama atenção para os determinantes sociais, e consequentemente para as iniquidades em saúde. Refletir sobre a pandemia a partir da interseccionalidade pode ser uma lupa para mostrar como as mulheres foram afetadas, sobretudo mulheres negras e de camadas populares, e os efeitos deste contexto na intensificação de suas experiências de sofrimento.. Foi preciso retornar ao lar, adaptar-se ao trabalho remoto e voltar-se mais intensamente aos cuidados dos filhos, sem o suporte fundamental de escolas e creches. Nas classes de maior vulnerabilidade socioeconômica, o público feminino, que em sua maioria exerce o trabalho informal, teve que lidar com a ausência de recursos econômicos e a dificuldade de executar as medidas preventivas diante das precárias condições sanitárias, de moradia e alimentação. Diante disso, este relato tem por objetivo descrever a experiência de um plantão psicológico remoto enquanto um dispositivo público que favoreceu o acesso de  mulheres ao cuidado em saúde mental durante a pandemia. O plantão psicológico surgiu enquanto um serviço temporário de acolhimento às demandas de saúde mental provenientes da pandemia ou intensificadas por esse contexto. Funcionando na modalidade remota, teve como objetivo atender o sujeito no momento mais próximo de sua urgência subjetiva, ofertando os encaminhamentos necessários a partir da demanda apresentada. Durante a experiência, foi possível observar que o serviço foi acessado predominantemente por mulheres, na faixa etária de 18 a 65 anos, negras e de camadas populares que buscaram acolhimento diante de suas demandas de sofrimento psíquico. Solitárias em seu mal-estar, encontraram no plantão psicológico um espaço de escuta e compartilhamento dos afetos. O real da pandemia destituiu essas mulheres de lugares que antes as constituíam e os recursos discursivos se desestabilizaram. Apresentavam-se imersas em angústia, endereçando à psicóloga do plantão aquilo que era da ordem do insuportável, em uma temporalidade que demandava pressa em encontrar respostas.  Vieram à tona incertezas e o desamparo, bem como as diversas violências que atravessavam suas histórias de vida, produzindo uma posição de assujeitamento e de fragilização do autocuidado. Algo que apareceu com frequência nas narrativas destas mulheres foi o rompimento de alguns laços sociais que as sustentavam na direção dos seus desejos e da construção da autonomia: a universidade, o ambiente de trabalho fora do lar e suas produções laborais. O plantão apresentou-se enquanto um recurso importante para o acesso de mulheres ao cuidado em saúde mental, atuando na redução das iniquidades em saúde, favorecendo a construção de novos discursos e busca de saídas para o sofrimento associado ao ser mulher na contemporaneidade, em um contexto pandêmico.