Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Uma análise interseccional da evasão escolar no contexto da Pandemia de Covid-19
Roberta Flores de Andrade, Marcia Fernanda de Mello Mendes, Eloisa Solyszko Gomes, Ana Paula Gemelli, Crissia Roberta Pontes Cruz

Última alteração: 2022-02-25

Resumo


Este estudo faz parte do Projeto Integrado ComVida: estratégias territoriais de promoção e educação em saúde, do Instituto Federal do Rio Grande do Sul - campus Alvorada, que tem como objetivo compreender e fomentar a participação social e as iniciativas de produção da saúde e de vida no território que surgiu como uma proposta de ações relacionadas ao enfrentamento do Covid-19 para além dos fatores biológicos, considerando as iniquidades e as violências que foram intensificadas pela pandemia. Com base nos objetivos específicos do projeto ComVida, como compreender as relações entre as necessidades de saúde dos diferentes grupos do território com os serviços de saúde e demais políticas públicas, propomos analisar a interseccionalidade de gênero, raça e classe presente na evasão escolar. Dados epidemiológicos demonstram que a pandemia tem cor, gênero e classe social, não se manifestando da mesma forma independente destes aspectos, fazendo-se fundamental que se amplie estudos que dêem visibilidade a este tema. Para isto, foram realizadas leituras de produções acadêmicas e relatórios oficiais que abordassem o tema, buscamos compreender como a evasão escolar, que é um fenômeno complexo, é atravessada por questões de gênero, raça e classe - pilares estruturais da desigualdade na sociedade brasileira. Dados referentes à desigualdade educacional são anteriores a pandemia e podem ser vistos no PNAD Contínua 2017, que sinaliza a diferença na experiência escolar entre estudantes brancos e não-brancos, não só no acesso como também na  permanência e desenvolvimento educacional. Segundo o Observatório da Realidade e das Políticas Públicas do Vale dos Sinos, a média de estudo entre estudantes brancos subiu de 11,7 para 11,9 anos, enquanto entre os estudantes negros, o aumento foi de 10,2 para 10,4 anos; e entre os estudantes pardos ocorreu uma diminuição de 10,7 para 10,2 anos de estudo, sendo  possível notar que há diferença na taxa média de escolaridade entre as cores, raças e etnias, e que permanece sendo a população branca a que possui mais anos de estudo. Além disso, o gênero também é um fator importante quando falamos desta temática, estudantes negros, do sexo masculino, acabam evadindo com maior frequência. Um levantamento realizado pelo PNAD Contínua 2018 e levantados pelo Instituto Unibanco analisou que a média de estudantes homens e negros que concluiram o ensino médio é de 55,8% comparado a 60,7% quando falamos de estudantes mulheres e negras. Também nesse caso, os estereótipos de gênero variam entre os principais fatores de risco associados à evasão escolar. No caso das meninas, a gravidez eleva em quase quatro vezes as chances de evasão, já que elas se veem em uma posição desfavorável devido a sobrecarga de responsabilidade atribuída à mulher no que se refere ao cuidado com os filhos e a ausência de políticas públicas que as auxiliem, aumentando assim a invisibilidade destas jovens. Já entre os meninos, o ingresso no mercado de trabalho é o fator mais recorrente, boa parte dos jovens entre 15 e 17 fora da escola e sem ensino médio completo estavam trabalhando ou procurando emprego. A evasão escolar é um problema recorrente e que se agravou durante a pandemia, a emergência na saúde pública contribuiu para desafios inesperados, como as aulas remotas, acarretando no acesso desigual desse mecanismo. Segundo (BARBOSA; CUNHA, 2020), que trouxeram em sua pesquisa um balanço da realidade vivida pelos jovens em meio a pandemia e sua relação com a educação, afirma que de acordo com o relatório realizado pelo Banco Mundial desde que a pandemia começou, estima-se que 1,4 bilhões de estudantes estão sem frequentar os espaços das escolas em mais de 156 países. Ademais, no Brasil, a realidade não destoa desses dados, em um levantamento realizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura rebateu que existem cerca de 53 milhões de estudantes estudando de forma remota no país. É notório que os grupos sociais mais vulneráveis acabam sendo afetados em maior escala, tendo como grande empecilho o desemprego que é um dos polos agravados em decorrência da pandemia juntamente com o aumento nos preços dos alimentos e produtos tornaram-se os principais motivos referentes à evasão de jovens, que precisam se privar dos estudos e trabalhar com objetivo de auxiliar na renda familiar (SOUZA; PEREIRA; RANKE, 2020). Isto retrata como o isolamento afetou diretamente em carências que repetidamente eram contornadas na aplicação das aulas presenciais, como a alimentação que era comumente oferecida para os estudantes nas escolas. Dessa forma, o ensino remoto, assim como a evasão  escolar, ampliada com a pandemia aumenta a lacuna entre jovens de diferentes classes sociais, potencializando a invisibilidade dos mais vulneráveis e oferecendo mais um entrave para que grupos específicos acessem o direito à educação e suas demandas sejam percebidas e sanadas pelos Estado. O fechamento das instituições de ensino contribuiram para a manifestação da desigualdade de acesso às tecnologias necessárias para a realização das aulas remotas, ocorrendo uma grande carência de recursos como internet e aparelhos eletrônicos, como smartphones e notebooks. Em 2018, o IBGE realizou uma pesquisa intitulada Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua - Tecnologia da Informação e Comunicação (Pnad Contínua TIC), relatando que um em cada quatro brasileiros não têm acesso à internet, em torno de 46 milhões de cidadãos. Segundo (BARBOSA; CUNHA, 2020) em sua pesquisa realizada através dos dados levantados pelo IBGE, constatou que por mais que os que conseguiam possuir acesso à internet entre os de menor renda permaneciam sofrendo com carência dos recursos durante o processo de aprendizado, principalmente relacionado a necessidade de notebooks. Em vista, várias são as razões que possam vir a levar a evasão desses estudantes, além do acesso a internet e aparelhos móveis, em relação ao ensino remoto faz-se necessário refletir também sobre as condições que estes jovens têm em suas casas para estudar, a estrutura é essencial nesses casos. Um fator importante é a falta de incentivo por parte da família que não consegue dar o devido respaldo e apoio para esses alunos continuarem mesmo de forma remota, tendo em vista esse aspecto a falta de espaços corretos para o estudo também afetam diretamente na concentração desses alunos. Outrossim, essa falta de contato acaba sendo um dos pontos que auxiliam no afastamento dos estudantes com as instituições e professores, o que pode acabar desmotivando esses estudantes a permanecerem realizando as atividades. A diferença dessas realidades acabam não tornando linear as oportunidades entre estudantes de diferentes classes sociais, afetando no desempenho dos que são menos favorecidos. É importante olhar essas características para que assim haja atenção das instituições e maiores incentivos nas políticas públicas, para garantir a equidade na educação. Analisar os fatores que estão associadas a estes dados não refuta a importância da escolaridade independente de raça, gênero e entre outros, mas possibilita que através da identificação desses grupos vulneráveis seja possível refletir acerca dessas razões que interferem em grupos específicos e promover uma mudança ainda maior.