Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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A SAÚDE MENTAL DO TRABALHADOR DA ATENÇÃO BÁSICA: UM OLHAR PARA O CUIDADO DAQUELES QUE CUIDAM
Íris Vieira de França, Eduardo Breno Nascimento Bezerra, Byanka Alves de Andrade Souza, Myria Juscilânia Maraço Silva, Caio César Ferreira Alverga, Jonathan Cordeiro de Morais

Última alteração: 2022-02-10

Resumo


APRESENTAÇÃO

As doenças ocupacionais são uma das causas que mais incapacitam os sujeitos ativos no Brasil. Logo, o presente trabalho traz à tona a problemática referente a formação continuada e, principalmente, o cuidado em saúde mental do trabalhador da Atenção Básica de Saúde. Por ser a primeira porta de entrada dos usuários do SUS para os demais níveis de saúde, faz-se importante pensar as formas de cuidados em saúde mental daqueles que primeiro recebem a população.

Neste sentido, a AB, como mencionada anteriormente, se configura como sendo o dispositivo de atenção à saúde que é primeiro procurado pelos usuários, haja vista sua localização estratégica, sendo ela no território diretamente em contato com a comunidade, facilitando a atuação e ações, já que os profissionais das Unidades Básicas geralmente pertencem ao mesmo contexto. Vale destacar que tais profissionais estão em contato com diversos tipos de acometimentos, sejam físicos ou psíquicos, cabendo a eles possuir estratégias de identificação para estas características. Não obstante, as questões envolvendo a saúde mental não raras vezes gera dúvidas, o que acaba por dificultar a identificação de transtornos mentais ou sofrimento psíquico e sua relação com os fatores estressores, como o trabalho (BRASIL, 2013).

Para tanto, estes profissionais precisam ser capacitados sobre o tema, o que nem sempre acontece, levando em consideração vários contextos, principalmente os políticos. Sendo assim, os profissionais das UBS’s quase sempre são inconclusivos e receosos quando o assunto é transtorno mental, fato que corrobora para a não identificação desses acometimentos, bem como para o não encaminhamento em casos de transtornos mentais relacionados ao trabalho, por exemplo. Mesmo havendo para onde direcionar, como é o caso dos CEREST’s, essas notificações são raras, o que nos leva a problematizar a saúde ocupacional, mais especificamente a saúde mental ocupacional e seus agravantes.

Faz-se importante pontuar que os próprios profissionais da atenção básica também são vítimas de eventos estressores que podem vir a acometê-los psiquicamente, pois estão imersos diretamente com diversas histórias angustiantes, doenças e sofrimentos dos usuários, além de conflitos interpessoais dentro do ambiente de trabalho (OSÓRIO, 2007). Não é raro pensar em assédio moral no ambiente de trabalho, síndrome de Burnout, Estresse Pós-traumático, dentre outras situações ou acometimentos que perpassam cotidianamente a vida dos trabalhadores da saúde. Logo, buscar orientar, capacitar e compreender a dinâmica de trabalho nas UBS’s se faz importante, ainda mais quando nos atentamos a saúde mental ou mais especificamente aos transtornos mentais que estão relacionados com o trabalho.

É pensando no cuidado dos outros e de si que Osório (2007) irá propor como estratégias de cuidados a formação continuada, bem como as reuniões de equipes a serem realizadas de forma periódica, de acordo com a necessidade de cada serviço, pois esses momentos possibilitam falar e trazer situações vivenciadas geradoras de estresse, conflitos ou até mesmo adoecimentos. A ideia é que esses profissionais da saúde possam sempre estar reciclando e elaborando o lixo psíquico acumulado no ambiente laboral.

MÉTODO

Na posição de estagiários da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) viabilizamos uma parceria junto ao Centro de Referência em Saúde do Trabalhador de Campina Grande (CEREST-CG) para uma atuação nas unidades básicas de saúde do distrito sanitário V em Campina Grande-PB.

Buscamos atuar junto às equipes interprofissionais de 23 Equipes de Saúde da Família, que totalizavam cerca de 200 profissionais de diversas áreas (médicos, enfermeiros, dentistas, ACS, recepcionistas, porteiros), proporcionando um espaço de reflexão, formação continuada e apoio no tocante a saúde mental.

Para tanto, realizamos nove processos formativos, onde geralmente se reuniam duas equipes referentes às unidades básicas de saúde que se localizavam próximas, totalizando pouco mais de 20 profissionais por intervenção. Essas, eram mediadas por três alunos de psicologia junto a um técnico do CEREST. Todos os momentos formativos foram realizados a partir de um roteiro norteador, mas o caráter horizontal proposto adequava-se de acordo com as demandas e contribuições do público-alvo.

No primeiro momento foram utilizadas técnicas que proporcionaram o espaço de fala dos participantes que partiam de uma contextualização da trajetória pessoal de cada sujeito e seu fazer, o que nos permitia sempre iniciar a discussão que apontava para o fato do fazer laboral se configurar como um marcador importante na constituição de identidade e, nesse sentido, justificar a relevância de compreender que não somente o exercício do trabalho em si, mas, principalmente, as relações que atravessam os sujeitos no ambiente de trabalho são determinantes para a constituição de sua subjetividade.

Inicialmente buscamos elucidar aspectos gerais de acidentes e doenças físicas relacionadas ao trabalho, enfatizando os tipos de acidentes mais comuns, a saber os acidentes típicos, acidentes de trajetos e os acidentes devido aos adoecimentos no trabalho. Em seguida, desenvolvia-se a formação acerca dos principais transtornos mentais que podem ser ocasionados em decorrência do trabalho, como: estresse agudo, Burnout e Depressão, entre outros, que foram detalhadamente discutidos e problematizados.

No segundo momento, as atividades seguiram com a proposta do pensar coletivo, trazendo estratégias de como prevenir\identificar\tratar os transtornos, assim como propor a construção de possíveis soluções para os desafios e tensões presentes no ambiente de trabalho daqueles profissionais. E por fim, o técnico do CEREST, apresentava o serviço como um dispositivo que está em favor da saúde física e mental dos trabalhadores da região, inclusive dos servidores da saúde.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A partir dos processos formativos realizados, bem como o espaço para debate e construção de conhecimento proporcionado pelas intervenções, os próprios trabalhadores das UBS’s se mostraram surpresos quando notavam que eles próprios, colegas próximos ou familiares, sofriam ou já haviam sofrido algum dos transtornos abordados, ou outro tipo de sofrimento psíquico relacionados ao trabalho.

Em algumas equipes percebemos a harmonia entre os profissionais e a baixa prevalência de sofrimento psíquico relacionao ao trabalho, bem como o compromisso com as reuniões de equipes, o que estava totalmente relacionado com a oferta de um bom serviço para a comunidade. Nas equipes onde as reuniões não ocorriam a realidade era diferente, havendo desarmonia entre o grupo, não se dando importância para reuniões, entre outros fatores que dificultavam a execução do trabalho, o que nos abriu espaço para reforçar que uma boa convivência é essencial para que ocorra um trabalho saudável e de qualidade no serviço, atentando-se para que as reuniões de equipe realmente aconteçam, além de proporcionar um olhar de cuidado, tanto para si quanto para o grupo.

Há uma necessidade de colocar esse assunto em pauta, além de fazer com que os profissionais despertem um olhar apurado no que se refere os transtornos mentais que podem estar relacionados ao trabalho, trazendo sofrimento para os sujeitos, faz também com que os próprios profissionais das unidades se impliquem e se coloquem no lugar de trabalhadores que também estão suscetíveis a sofrer desses transtornos, abrindo lugar para o cuidado além da saúde física, possibilitando encaminhamentos de todos os trabalhadores para os serviços especializados como o CEREST.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde mental / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2013.

OSÓRIO, L. C. Grupoterapias: abordagens atuais. Porto Alegre: Artmed, 2007.