Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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HANSENÍASE EM REDE: EDUCAÇÃO POPULAR EM SAÚDE INTEGRANDO ENSINO-SERVIÇO-COMUNIDADE
Lorrainy da Cruz Solano, Juliana Maria de Medeiros Silveira, Stefano Simoni, Ricardo Burg Ceccim, Ana Flávia Sobral de Medeiros, Andrea Taborda Ribas da Cunha, Débora Lotufo Manzano, Paula Soares Brandão

Última alteração: 2022-02-09

Resumo


APRESENTAÇÃO


A hanseníase é uma doença crônica transmissível e uma das doenças mais antigas que existem no mundo. No Brasil, segundo país que tem mais casos da doença diagnosticados, as regiões com maiores índices de concentração de casos diagnosticados são as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste.

Mesmo após alguns avanços relacionados à criação de políticas públicas voltadas para pessoas atingidas pela hanseníase e para eliminação da doença no mundo, ainda podem ser observados diversos desafios, desde à abordagem limitada das políticas e serviços de saúde até a luta contra o estigma e discriminação.

Um ponto que muitas vezes dificulta a aproximação da sociedade com a temática relacionada à hanseníase, bem como o diagnóstico e tratamento precoce da doença, é a perspectiva biologizante com a qual ainda se enxerga a hanseníase, com foco apenas nas manchas e lesões, deixando de lado o/a usuário/a, o meio em que vive, o contexto social, cultural e econômico.

Portanto, considerando a necessidade do cuidado integral voltado às pessoas atingidas pela hanseníase, compreendemos também a importância do papel da Atenção Básica como essencial na promoção do cuidado junto aos territórios, bem como a necessidade da garantia da clínica ampliada no intuito de fortalecer uma articulação direta com os e as comunitárias e o respeito e diálogo entre diferentes saberes.

Diante disso, neste trabalho pretendemos relatar a experiência do projeto “A Hanseníase em Rede de Interfaces: saúde, educação e sociedade”, executado pela Associação Brasil Saúde e Ação - BRASA, no município de Mossoró, no estado do Rio Grande do Norte, desde março de 2021 até o período atual. Mossoró é o município que tem maior índice de casos diagnosticados de hanseníase em todo o estado, tendo sido notificados, no ano de 2021, 54 casos, totalizando 27% do total de casos diagnosticados neste ano no RN.

Objetivamos apresentar a implementação, metodologias participativas e os resultados preliminares do projeto.



DESENVOLVIMENTO


O projeto Hanseníase em Rede de Interfaces tem como principal foco apostar na vigilância e educação popular em saúde como estratégias fundamentais no enfrentamento da Hanseníase e, consequentemente, na diminuição da transmissão e prevenção de agravos da doença por meio da identificação precoce dos casos. Para isso, pensamos ser de grande importância o envolvimento de sujeitos essenciais nesse processo: profissionais da saúde (da Atenção Básica), gestão e comunidade, formando uma rede afetiva de promoção à saúde e enfrentamento da hanseníase.

Inicialmente, na fase de planejamento das ações, foram realizadas visitas nas Unidades Básicas de Saúde do município no intuito de mobilizar profissionais da Atenção Básica a estarem participando do projeto.

Ao trabalhar numa perspectiva de ampliar a vigilância em saúde e descentralizar o cuidado em saúde de profissionais médicos/as e enfermeiros/as, como historicamente tem sido feito em decorrência do tratamento biomédico que se dá à doença, o convite a participação foi de que cada equipe da Estratégia Saúde da Família - ESF indicasse 2 profissionais, não havendo distinção entre profissionais. Ao todo, no município existem 70 equipes.

Sendo assim, estiveram participando do projeto, profissionais de diversas profissões: enfermagem, odontologia, serviço social, agentes comunitários de saúde, fisioterapia e psicologia, incluindo residentes dos programas de residências da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte em parceria com a Prefeitura Municipal de Mossoró.

Além disso, os/as profissionais foram orientados a indicar pessoas de cada território para participar. O baixo número de participações de comunitários/as (aproximadamente 15 pessoas) indicados/as pelas equipes nos apontou para um resultado interessante para se pensar a dificuldade de trabalhar com vigilância e educação popular em saúde na comunidade: a limitação do vínculo entre as equipes ESF com os territórios da Atenção Básica.

A partir desse primeiro contato, foram realizados os Laboratórios Comunidade de forma virtual, espaços de diálogo em que pudemos conhecer o universo vocabular do grupo e suas percepções sobre hanseníase e sobre a rede de atenção à saúde, além de iniciar um vínculo com os sujeitos envolvidos no projeto. Os Laboratórios Comunidade também foram base para serem construídos os materiais educativos que foram utilizados na execução do Ciclo Formativo realizado posteriormente.

Durante a execução, devido à abordagem comunitária e perspectiva social utilizadas, foi sendo criado um vínculo com o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase - MORHAN, o qual participou de diversas lives realizadas no decorrer do projeto, bem como fez parte do Ciclo Formativo e da produção de materiais educativos, aproximando o projeto ainda mais da perspectiva de luta pelos direitos das pessoas atingidas pela hanseníase.

O Ciclo Formativo em Hanseníase e Atenção Básica foi realizado com participação de profissionais de saúde, comunitários/as e representantes da gestão municipal do Programa de Hanseníase e foi trabalhado a partir de 4 temáticas: Acolhimento; Atenção Básica; Abordagem Interprofissional e Comunitária; e Necessidades terapêuticas das pessoas afetadas pela hanseníase.

Outro objetivo, dentro dessa perspectiva, foi o de formar Agentes Populares de Saúde a partir da participação das referências territoriais indicadas pelos profissionais como forma de impulsionar a vigilância e educação em saúde nas comunidades.

Durante o Ciclo, foram utilizadas metodologias ativas no intuito de fomentar maior participação das pessoas, entendendo que são estas que estão no cotidiano dos serviços de saúde e dos territórios, portanto, são elas que podem estar pensando alternativas para enfrentamento a Hanseníase a partir de sua própria realidade. Assim, as temáticas foram trabalhadas com profissionais e Agentes Populares divididos a partir dos Distritos Sanitários do município.

Dentre as metodologias, foram utilizadas rodas de conversas, vídeo-debate, construção de cartografias sociais e de planos de intervenção a partir das reflexões de cada território e distrito e por fim, foram realizados os planos de intervenção e apresentados a partir da metodologia “Feira Soma Sempre”.

Além disso, no decorrer do projeto foi desenvolvido um aplicativo de celular com o objetivo de facilitar o encaminhamento e discussão de casos suspeitos e o matriciamento dos casos.

Outro produto foi a construção de vídeos educativos a partir da própria experiência do ciclo formativo.



RESULTADOS

A partir da realização das ações do projeto, foi perceptível a aproximação de profissionais de saúde e comunitários que participaram, principalmente devido às metodologias participativas utilizadas. Além disso, a partir das discussões coletivas, o grupo demonstrou um entendimento mais amplo acerca do enfrentamento da hanseníase, passando a enxergar, para além do biomédico, uma visão de cuidado integral às pessoas atingidas.

Como resultado, pudemos ainda perceber a articulação com o MORHAN como de grande importância para o direcionamento político e social do projeto, e o fortalecimento de uma articulação estadual para criação de uma política estadual que abranja às pessoas atingidas pela hanseníase.

Outro resultado obtido é que foi possível perceber como este projeto pode ser reproduzido em outros contextos geográficos (municipais, estaduais), por possuir um alto grau de replicabilidade, podendo, assim, ser expandido pensando, inclusive, em outras Doenças Tropicais Negligenciadas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


A execução do projeto foi de grande importância para se pensar, na prática, um enfrentamento à hanseníase e a luta por direitos das pessoas atingidas pela hanseníase que contemple profissionais de saúde, gestão e comunitário/as, entendo essa corresponsabilização do cuidado integral como essencial no processo saúde-doença.