Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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O diário de aprendizagem como ferramenta e experiência pedagógica em cursos de saúde: um relato de experiência.
Luciana Pereira Colares Leitão, Igor do Carmo Santos

Última alteração: 2022-02-10

Resumo


Apresentação: A pandemia da COVID-19 trouxe inúmeras repercussões para a sociedade mundializada na qual vivemos, e isso não apenas na área da saúde. Um dos lugares impactados foi o campo da educação, sobretudo nas suas práticas pedagógicas e docentes. Com as medidas de isolamento social adotadas pelos governos dos principais países do mundo a partir de orientação de Organizações Transnacionais, como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), o Sistema de Educação regular precisou interromper suas atividades. Em março de 2020, cerca de cem países apresentaram o fechamento das escolas como medida de contenção para a propagação do novo coronavírus. Com o prolongamento e o crescente aumento do número de casos e mortes à medida que o vírus se alastrava, vários setores da sociedade começaram a dialogar sobre formas e maneiras de manutenção de suas diferentes atividades dentro desse novo contexto pandêmico, o que se convencionou chamar da busca de produção de um “novo normal”. Em face à essas exigências de “retorno gradual”, “readequação”, “flexibilização” que atingiu também os serviços educacionais, várias entidades e órgãos do Estado e da Sociedade Civil se mobilizaram em discussões acerca dessa nova condição e de suas possibilidades. Vamos nos ater aqui a algumas discussões e repercussões presentes principalmente dentro das Instituições Federais de Ensino, que era a realidade dos autores do presente texto à época da realização deste trabalho e vivência dessa experiência aqui relatada. O quadro geral da situação da educação no país e do ensino público no início de 2020 já se apresentava bastante preocupante, em um momento crítico de redução dos investimentos (reflexo das consequências da Emenda Constitucional 95 que instituiu o Teto de Gastos, que congelou os recursos direcionado às políticas públicas e setores sociais), em mudanças constantes no Ministério da Educação (ocupado por pessoas que deram inúmeras declarações que iam na contramão dos princípios e valores de uma educação laica, democrática e libertadora), nas interferências arbitrárias nas Reitorias das Universidades pelo Governo Federal, com a indicação de nomes que não correspondiam aos eleitos pela comunidade acadêmica (ferindo a garantia constitucional da autonomia universitária), além da presença das novas tecnologias e do Ensino à Distância (EAD) como modalidades que buscavam ingressar nesse cenário (com atenção para o interesse econômico de grupos empresariais nesse novo mercado). Em face desse conjunto de forças impulsionadas e aceleradas pela pandemia e os processos sociais dela decorrentes, é que os autores desse trabalho se encontravam dentro de um contexto de ensino de graduação na área da saúde. Objetivo: esse trabalho busca apresentar uma experiência de utilização do recurso da estratégia de escrita de um “diário de aprendizagem” como recurso metodológico de ensino e avaliação em cursos da saúde. Esse trabalho foi desenvolvido dentro do contexto abordado acima, em que é produzida a demanda de construção de estratégias de ensino em modalidade remota. Os autores do trabalho eram vinculados ao quadro de docentes de uma instituição pública de ensino federal, ministrando disciplinas para cursos distintos, mas que conversam entre si, que são o curso de graduação em Saúde Coletiva e graduação em Psicologia. Diante da modalidade de um Ensino Remoto Emergencial (ERE) implementado pela referida instituição, os docentes receberam um curso de formação voltado à aprendizagem de modelos de ensino com o uso de novas tecnologias. Ainda que o curso tenha possibilitado o conhecimento e acesso a recursos digitais desconhecidos pelos autores e que ampliaram o leque de recursos utilizados junto aos discentes, permanecia a preocupação de como este ensino oferecido poderia efetivamente propiciar uma “experiência” de aprendizagem, como já apontado por Jorge Larrosa. Para além da técnica, entendíamos que algumas questões eram de ordem ética: como o ensino remoto, com a imposição da distância física pode propiciar aproximações, contatos do sujeito como o seu “objeto” de conhecimento? Como ensinar, sem saber o que “se passa” com os discentes ao longo de uma disciplina? Como inserir a “vida” que passava por tantas mudanças e incertezas naquele ensino? Desenvolvimento: A proposta de criação de um “diário de aprendizagem” surgiu pela possibilidade de aproximação de compartilhamento de conhecimentos entre professores e discentes, em um momento em que a proximidade física estava impossibilitada. Com esse contato reduzido e o tempo das aulas remotas abreviadas, a maior parte da relação do discente com as disciplinas se dava com os textos de referência, atividades e outros materiais que o docente poderia disponibilizar. Isso nos deixava diante da dificuldade de perceber o envolvimento e relação do discente com o conteúdo, temas e competências requeridas pela disciplina ministrada. Ainda que o uso de fóruns, videoconferências, chats e outros espaços possibilitassem um contato acerca do desenvolvimento do conteúdo, era perceptível que esse contato virtual ainda deixava lacunas que não eram percebidas com o contato físico na sala de aula. Diante dessa dificuldade, nos mobilizamos a pensar em estratégias que oferecessem uma percepção mais próxima de como estava sendo a própria vivência do estudante com o seu aprendizado dentro desse cenário. O recurso do “Diário de Aprendizagem” aparece então como essa prática metodológica e pedagógica onde o discente tem a possibilidade de construir uma relação mais intimista com o conhecimento que, estando construído, passa a reconstruir para si mesmo. Nesse sentido, a proposta do diário não apresenta uma estrutura definida, ou seja, não era repassado um modelo para os alunos de como ele deveria ser produzido, abrindo a possibilidade para a livre criação. Assim como o diário pessoal, onde registramos sentimentos, emoções, ideias, desejos, sonhos e vivências de maneira mais solta e sem muitas regras e normas, o “Diário de Aprendizagem” buscava possibilitar a expressão desembaraçada do discente com aquele conteúdo oferecido. A proposta em um primeiro momento gerou estranhamento em parte dos discentes e nossa hipótese é de que isso ocorreu devido aos formatos já pré-concebidos e formatados de avaliação e acompanhamento de uma disciplina por parte das instituições de ensino. Embora a proposta possa ter gerado esse efeito de ausência de regras na sua composição, o Diário de Aprendizagem apresentava uma regularidade para sua entrega e transmissão. Resultados: a princípio, a estrutura do diário deveria seguir o formato escrito tradicional, porém, a diversidade de realidades e vivências discentes fez com que outras produções emergissem. Recebemos diários em formato de podcast, vídeos, desenhos, teatro e expressões escritas que foram para além de uma estrutura dissertativa e de prosa, mas foram trazidos também poemas e imagens poéticas. Dentro dessas diversas expressões os estudantes relataram que, embora no início se sentissem retraídos e sem saber o que relatar, aos poucos deixavam-se levar pelo envolvimento com os temas e como isso os havia afetado, compartilhando aquilo que muitas vezes não consegue ser expresso com palavras argumentativas. Considerações finais: O diário de aprendizagem se mostrou como uma importante ferramenta e estratégia pedagógica de acesso a experiência discente-docente de aquisição e compartilhamento de conhecimento, sobretudo em um contexto de ensino remoto. Entendemos que a proposta obteve um resultado interessante na medida que trouxe engajamento e participação dos estudantes na aceitação e realização das atividades. Desta forma, se mostra potente em ser utilizado em outras áreas de ensino como ferramenta de aprendizagem, seja como instrumento avaliativo, ou somente de percepção.