Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida
v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Última alteração: 2022-02-10
Resumo
Apresentação: Decorrentes do processo de envelhecimento acontecem modificações interindividuais no ciclo sono-vigília da pessoa idosa, determinadas por fatores biológicos, psicológicos, sociais e comportamentais que podem interferir na qualidade e quantidade do seu sono, com consequências como maior risco de quedas, sonolência diurna excessiva, comprometimento cognitivo e disfunção diurna. As queixas do sono podem piorar com os hábitos e comportamentos não saudáveis. Os programas para a terceira idade são espaços com a potencialidade de promover comportamentos do autocuidado. Nesse sentido, o objetivo da pesquisa foi promover educação em saúde para o cuidado do ciclo sono-vigília no envelhecimento com os idosos participantes de três Programas para a Terceira Idade (PTI) do município de Campos dos Goytacazes/RJ durante o período de 2017-2018. Desenvolvimento: O estudo consistiu em quatro etapas. Na primeira etapa, com apoio e participação dos coordenadores dos PTI, realizou-se uma palestra sobre a importância do cuidado do sono no envelhecimento, onde foram convidados os idosos a participar da oficina educativa “Dormir Bem, Viver Melhor”. Na segunda etapa foram aplicados nos idosos inscritos na oficina os instrumentos: questionário de dados sociodemográficos e relacionados à sua saúde, questionário de qualidade de vida SF-36, Índice de qualidade do sono de Pittsburg (IQSP), Escala de Sonolência de Epworth (ESE) e Diário de Sono (DS) de duas semanas, Na terceira etapa, desenvolveu-se a prática educativa com objetivo de criar um espaço de ensino-aprendizagem para a promoção de hábitos e comportamentos para um sono saudável no envelhecimento, com uma duração de 12 encontros de uma hora e trinta minutos, uma vez por semana, abordando quatro unidades temáticas: “O processo de envelhecimento humano”, “O ciclo sono-vigília no ser humano”, “O ciclo sono-vigília no envelhecimento” e “Práticas saudáveis do ciclo sono-vigília no envelhecimento”. Utilizou-se a metodologia participativa problematizadora como proposta pedagógica encaminhada ao processo de indagação e reflexão baseada na própria realidade dos sujeitos. Cada encontro trabalhou-se através de perguntas disparadoras e um conjunto de atividades registradas pelos idosos em “Meu diário de sono-vigília”. Dentre outros recursos didáticos foram usados rodas de conversa que incluíram convidados como nutricionista, professora de yoga e professora de arteterapia, estudos de caso e apresentação de temas pelos participantes. Enfatizou-se na ressignificação do ciclo sono-vigília promovendo processos dialógicos e valorizando os saberes populares dos participantes. Na etapa final, aplicou-se novamente o IQSP, a ESE, o DS e realizaram-se entrevistas semiestruturadas para abordar as percepções, os sentidos, os significados e as aprendizagens dos idosos em relação ao seu ciclo sono-vigília ao longo da vida e o impacto deste processo de educação em saúde. Foram incluídos os participantes dos PTI com 60 anos ou mais que concluíram as atividades propostas na oficina incluindo frequência mínima de 80% nos encontros semanais. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética sob CAAE nº 69247717.1.0000.5244 e parecer nº 2.173.349. Resultados: Dos três PTI, 90 idosos participaram da primeira etapa; porém, por critérios de inclusão, a amostra foi composta por 20 idosas com idade média de 66,9 ± 5,0 anos, nas faixas etárias de 60-64 anos (35%), 65-69 anos (35%) e 70 ou mais anos (30%). Enquanto caracterização sociodemográfica, 50% das idosas completaram o ensino médio, 50% de estado civil casadas, 35% com arranjo familiar unipessoal, 75% referiram receber aposentadoria, 35% tinham alguma ocupação laboral remunerada, 15% sem renda própria, 90% contavam com residência própria. O tempo de participação nos PTI foi em média de 3,6 ± 4,4 anos, 25% das idosas participaram em mais de um PTI. Das participantes, 100% tinha sua capacidade funcional preservada, 45% avaliaram sua saúde como “boa”, com média de 2-3 doenças crônicas/idosa, 80% hipertensas e 20% com diagnóstico de insônia, 50% com uso crônico de 2-3 medicamentos. Em quanto sua qualidade de vida segundo o SF-36, os domínios com maior afetação nas idosas foram: limitação por aspectos físicos (63,75±42,52), dor (68,35±21,95), estado geral de saúde (69,45±14,28) e aspectos emocionais (71,67±40,86); e o domínio com menor afetação correspondeu a aspectos sociais (81,88±20,87). Segundo o IQSP, 75% apresentaram qualidade de sono ruim, 20% pontuaram para sonolência diurna excessiva segundo a ESE e 65% referiram uso de medicação para dormir pelo menos uma vez por semana antes da educação em saúde, diminuindo na avaliação posterior a 55% (IQSP), 5% (ESE) e 40% das idosas reduziram a frequência de uso de medicação para dormir. Na análise multivariada (teste T2 de Hotteling, α=0,05), a intervenção teve efeito positivo com melhora da qualidade do sono pela diminuição da latência do sono. Variáveis como idade, número de medicamentos usados frequentemente, capacidade funcional, dor, aspectos sociais, e limitação por aspectos físicos apresentaram associação com a qualidade de sono das idosas. Dois modelos de árvore de decisão exibiram que nas participantes, menor latência do sono, menos despertares noturnos e a diminuição a um cochilo diurno com duração de menos de 30 minutos prevê melhor qualidade do seu sono e melhora na percepção da renovação e descanso após acordar. A falta de controle das emoções e a ansiedade, somada aos hábitos mal adaptativos era uma das causas principais que afetavam a conciliação e consolidação do sono. Atividades de relaxamento, controle de emoções, reorganização de rotinas e estratégias para diminuir os despertares noturnos puderam contribuir nos resultados obtidos. Referido aos seus sentidos e significados, o sono, para as idosas significava descanso, renovação, relaxamento, bem-estar, saúde mental e física, além de uma desconexão necessária do estado de vigília. Diversas queixas do sono apareceram ao longo da vida como consequência de situações estressantes e emocionalmente marcantes como a morte do conjugue ou de filhos. As modificações mais relevantes do sono na velhice foram os despertares noturnos frequentes e antes do desejado. As idosas avaliaram positivamente sua participação na oficina, a qual permitiu a criação de um espaço coletivo de aprendizagens que replicaram nas suas famílias e possibilitaram a reflexão e modificação de hábitos de sono não saudáveis como manter rotinas e horários irregulares de sono, o uso excessivo de aparelhos eletrônicos perto do horário de dormir, a utilização da cama e do quarto para atividades diferentes ao sono, a associação da cama e a hora de dormir como um espaço para refletir sobre as atividades do dia e pensar na solução de problemas, ficar por tempo prolongado na cama tentando conciliar o sono em caso do sono fragmentado e realizar cochilos diurnos prolongados. Desde outro ângulo, ressalta-se que uma das percepções mais relevantes nas idosas sobre a qualidade de vida no seu processo de envelhecimento referiu-se às suas possibilidades de participação social e vida ativa, destacando sua atividade nos PTI ao impactar positivamente no seu autocuidado. Considerações finais: a educação em saúde, instrumento de produção de conhecimento e construção coletiva, constituiu uma ferramenta de ressignificação do cuidado do ciclo sono-vigília no envelhecimento, potencializado pelos ambientes criados nos programas da terceira idade, como redes de apoio e espaços de promoção da saúde na população idosa. Abordou-se, em forma interdisciplinar, o ciclo sono-vigília no âmbito do cuidado e não da intervenção sobre a doença ou dos distúrbios do sono, para continuar fortalecendo um novo paradigma dirigido ao sono saudável que deve prevalecer ao longo da vida.