Associação da Rede Unida, 15º Congresso Internacional da Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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ATENÇÃO PSICOSSOCIAL E INTERSETORIALIDADE: UM TRABALHO ORIENTADO PELA PSICANÁLISE
Alex Mendes

Última alteração: 2022-02-11

Resumo


A presente pesquisa tem como tema o trabalho em rede intersetorial no campo da atenção psicossocial e a contribuição da psicanálise para este trabalho. Tal estudo tem como objetivo final, enquanto produto técnico advindo de um Mestrado Profissional, contribuir para a elaboração de um protocolo de trabalho que ofereça fundamentação teórica e operacional à articulação de uma rede intersetorial de cuidado em atenção psicossocial. Para tanto, a pesquisa se vale de revisão integrativa em torno do trabalho intersetorial em atenção psicossocial, do relato em diário de campo referente à prática diária de trabalho nas instituições em questão e da realização de grupos focais e entrevistas com profissionais de dois serviços que compõem a rede de atenção psicossocial da cidade de Boa Vista (RR), um Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS) e um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II), que compõem o campo da pesquisa. A experiência registrada na pesquisa de campo será articulada a conceitos da psicanálise, como construção coletiva do caso, saber em reserva, transferência de trabalho, entre outros.

Enquanto produto do Mestrado Profissional em Atenção Psicossocial do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a presente pesquisa teve como ponto de partida as experiências do pesquisador no trabalho de articulação intersetorial em atenção psicossocial e na identificação de impasses frente a multiplicidade de discursos que compõem as redes. Tais experiências se deram, previamente, como psicólogo no CREAS Centro (Boa Vista - RR), serviço de proteção social especial e, atualmente, como psicólogo no CAPS II da mesma cidade.

Enquanto suposição hipotética que norteia a pesquisa, há a aposta de que a psicanálise apresenta orientações para o trabalho em atenção psicossocial que possibilitam um diálogo intersetorial na perspectiva da atenção à singularidade dos sujeitos envolvidos mesmo diante de diferentes perspectivas e responsabilidades dos setores. A atenção psicossocial, no processo de expansão do trabalho em rede não deve perder seu fio condutor inicial e nem ser reduzida a estratégias pedagógicas ou morais, sendo necessário o “rigor quanto à nossa compulsão em querer sanar o mal, combater os desvios da norma e sequestrar liberdades mínimas” frente ao sujeito singular e os impasses no cuidado intersetorial.

O referencial bibliográfico da pesquisa em questão se combina e ramifica a partir dos termos intersetorialidade, atenção psicossocial e psicanálise. Abrange inicialmente o campo das políticas públicas em um aspecto amplo no que diz respeito ao princípio da intersetorialidade, sua origem e a lógica à qual subjaz, seguindo para a apropriação deste princípio na política de saúde mental e atenção psicossocial a partir do processo da Reforma Psiquiátrica Brasileira e do paradigma da desinstitucionalização.

Abordamos de maneira introdutória a intersetorialidade na política de saúde mental e atenção psicossocial como um dos direcionamentos prioritários para o campo, entendendo que esta é primordial para uma assistência que se desenvolva de fato no território e que intencione uma mudança ampla de perspectiva na sociedade em torno dos estigmas que acompanham as pessoas com transtorno mental. Neste sentido, é importante compreendermos como o conceito de intersetorialidade, que não se restringe ao campo da atenção psicossocial, se desenvolveu nas políticas públicas como uma maneira de pensar a integração de ações e superar a fragmentação e desarticulação dos esforços na administração pública.

Trata-se de uma pesquisa de cunho qualitativo que se utiliza da revisão bibliográfica integrativa, da realização de grupos focais e entrevistas semiestruturadas com profissionais da rede intersetorial, e do relato de minha experiência como profissional dos setores de saúde pública e de assistência social de Boa Vista a partir de registros em caderno de campo.

A pesquisa conta com a realização de encontros de discussão com  um grupo formado por profissionais de dois serviços que compõem a rede intersetorial de atenção psicossocial na cidade de Boa Vista - RR, sendo um deles o CREAS Centro, que atua no campo da Proteção Social Especial, especificamente a equipe da Coordenação do Idoso e da Pessoa com Deficiência (CIPD), que lida diretamente com a articulação intersetorial do cuidado de usuários que além de sofrerem violações de direitos, apresentam importante sofrimento psíquico e se encontram em tratamento em saúde mental em Centros de Atenção Psicossocial, ambulatórios de saúde mental ou na atenção básica.

O outro serviço que terá membros participando do grupo focal é o CAPS II Dona Antônia de Matos Campos, serviço de saúde mental de referência para o cuidado em atenção psicossocial voltado a pessoas em sofrimento psíquico severo e persistente no âmbito municipal.

As discussões buscam abordar, a partir da realização de grupos focais, a perspectiva dos profissionais sobre as potencialidades e impasses da articulação intersetorial em atenção psicossocial, seja em relação ao acompanhamento propriamente dito dos usuários quanto na relação com espaços coletivos de constituição do trabalho em rede. Intenciona-se, a partir disso, levantar tópicos para discussão sobre a intersetorialidade no campo da política de atenção psicossocial e auxiliar de maneira prototípica a formação de um espaço de discussão em rede para a superação de possíveis impasses que foram levantados a partir da própria experiência do pesquisador enquanto profissional das duas unidades. Tais constatações se estruturam a partir dos seguintes tópicos:

●       Dificuldade de articulação cotidiana entre os serviços que compõem a rede em função de suas maneiras distintas de conceber o sujeito assistido e o objetivo da assistência prestada;

●       Não estruturação de um investimento institucional em espaços ou fluxos de comunicação entre os serviços envolvidos na assistência aos usuários;

●       Baixo reconhecimento e investimento insuficiente em relação a espaços de supervisão clínico institucional para os serviços e para a rede por parte das instâncias gerenciadoras das políticas públicas envolvidas na assistência a pessoas em grave sofrimento psíquico;

●       Escassez do compartilhamento do saber entre os profissionais da rede sobre os serviços e atores que a compõem e a atuação destes na perspectiva da atenção psicossocial em suas respectivas áreas;

●       Percepção por parte dos profissionais da rede sobre o trabalho em rede ser realizado exclusivamente a partir de instâncias formalmente instituídas, sem considerar a rede construída pelo usuário e que envolve instâncias informais;

●       Possível inefetividade de um trabalho em atenção psicossocial de fato territorial que não seja organizado e planejado de maneira compartilhada entre os serviços que compõem a rede daquele usuário;

Ao final da pesquisa, é esperado que a pesquisa contribua com os serviços envolvidos a partir da elaboração de um guia ou protocolo para o aprimoramento do trabalho em rede intersetorial. Há ainda a ideia de que os resultados da pesquisa sejam apresentados em congressos ou espaços de discussão nas áreas de estudo que abordam o tema, além de ser passível à publicação para maior alcance da divulgação dos resultados obtidos.