Associação da Rede Unida, Encontro Sul 2019

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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ARTESÃS DE HISTÓRIAS: A UTILIZAÇÃO DA BONECA ABAYOMI COMO RECURSO PARA DEBATES ÉTNICO-RACIAIS
Brenda Rafaella da Silva Magalhães, Debora Lydinês Martins Corsino, Edilaine Fungari Cavalcante, Kelly Cristiane Michalichen, Fabíola da Silva Miranda, Celina Teruko Hokama, Ester Massae Okamoto Dalla Costa

Última alteração: 2019-07-31

Resumo


Na atualidade, observamos que existe um crescente movimento de debates étnico-raciais, discussões acerca das vulnerabilidades da população negra, racismo, cotas, propostos em grande parte por movimentos sociais e coletivos de pessoas negras. Estes debates, no entanto, geralmente ocorrem em espaços institucionais, acadêmicos e políticos, dificultando a aproximação da população em geral, dessas pautas. Nesse sentido, descreveremos, neste trabalho, uma experiência de conexão entre arte e cultura na produção do cuidado, e como um movimento de resistência, realizada em um dos encontros do Grupo de Convivência, que ocorre no território da Unidade Básica de Saúde (UBS) Lindóia, em Londrina - PR. O grupo de Convivência é um grupo aberto, com atividades mediadas por profissionais da Residência Multiprofissional em Saúde da Mulher (RMSM) da Universidade Estadual de Londrina. Pensando em tratar do tema étnico-racial, propomos em um dos encontros no mês de junho de 2019, a confecção da boneca Abayomi, que tem em sua história, uma relação com o movimento de resistência da população negra. No início da atividade, cada participante foi informada que iria confeccionar a boneca, e que ao final seria contada sua história e origem. Logo no início foram repassadas as instruções de materiais necessários; entre eles, dois retalhos de tecido preto, que representaria a pele da boneca. Neste momento, algumas mulheres questionaram se era obrigatório ser dessa cor, se não podia ser outra cor, e respondemos que deveria ser preta, e que no momento da história, elas entenderiam o motivo. Ao longo da construção do vestido, do turbante, surgiram alguns comentários sobre a Abayomi, como “parece vodu” e que “faltavam apenas algumas agulhinhas para espetar nela”. Uma participante chegou a bater na boneca enquanto estava no processo de finalização, e apenas uma fez um comentário mais sutil: “parece uma baianinha”. Vale registrar que apenas uma participante era branca, e permaneceu em silêncio o tempo todo. Ao término da atividade, foi contada a história: Abayomi, do dialeto Iorubá, significa “encontro precioso”. A boneca surgiu nos navios que traziam africanos para serem escravizados no Brasil. As mulheres, para acalentar seus filhos, rasgavam as barras de suas saias e confeccionavam as bonecas apenas com nós ou tranças, para as crianças terem algo para brincar. Apesar da construção ser simples, a boneca tornou-se um símbolo de resistência e resgate histórico de negros e negras. Com a finalização da história, as mulheres compreenderam porque era necessário representar o corpo com o tecido preto, e afirmaram ser interessante ouvir este tipo de história. No momento de ir embora, todas pediram que o nome da boneca fosse anotado, para que não se esquecessem, demonstrando uma mudança do discurso inicial. As mulheres que já tinham netos enfatizaram que iriam contar a história e ensiná-los a fazer a Abayomi. Conclui-se que a realização da atividade que integrou a arte e a cultura proporcionou uma reflexão sobre  questões étnico-raciais, e a sensibilização para um movimento de cuidado e resistência.