Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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INTERAÇÃO NA BASE REAL I: reflexões iniciais sobre um componente curricular híbrido
Teógenes Luiz Silva da Costa, Juliana Gagno Lima, Wilson Sabino, Rui Massato Harayama, Hernane Guimarães dos Santos Junior, Heloisa do Nascimento de Moura Meneses, Annelyse Rosenthal Figueiredo

Última alteração: 2018-01-26

Resumo


Apresentação

A prática docente nos proporciona experiências e, a partir destas, reflexões teóricas riquíssimas, contexto que motiva este escrito é um exercício de sistematizar algumas destas reflexões, pautadas na vivência docente. O componente curricular Interação na Base Real (IBR), parte do Projeto Pedagógico do Curso (PPC) Bacharelado Interdisciplinar em Saúde – BIS, do Instituto de Saúde Coletiva – ISCO, na Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA, configurando-se como uma “peça” de importância ímpar na formação em saúde.

O referido componente curricular, é ministrado em quatro etapas, correspondente a uma por semestre: IBR I, II, III e IV. Tal disciplina representa sozinha algo em torno de 10% de toda a carga horária do curso – ressalta-se que o BIS possui carga horária total de 2.490 horas, deste total, somente IBR configura 240 horas aulas. Esse dado é significativo quando se explora a natureza deste componente curricular.

Dito isto, ressalta-se que o objetivo deste texto é dar visibilidade à experiência educacional na formação acadêmica em saúde, a partir da vivência docente por nós experimentada em 2017, tendo por base, especificamente, IBR I. Cabe salientar que essa experiência foi realizada por dois educadores que acompanharam duas turmas (turnos integral e noturno, respectivamente) de recém-ingressos nos cursos de Farmácia e BIS. Tal componente curricular é aqui concebido como híbrido em razão de sintetizar duas dimensões de conhecimento, a prática (ou experiência) cotidiana, e a teoria na formação de em saúde.

 

Descrição da experiência

Inserido num contexto de “nova universidade”, que valoriza cursos de graduação interdisciplinares, o BIS se propõe formar indivíduos com conhecimentos diferenciados em saúde. A ideia central do curso é que os egressos sejam capacitados a partir de uma aproximação com a realidade de comunidades locais, pois são estas que prioritariamente mais utilizam os serviços do Sistema Único de Saúde – SUS.

É neste sentido, o da busca por estreitar laços entre acadêmicos e comunidade, que o componente IBR desempenha papel de destaque, pois desde a primeira etapa (IBR I) os educandos são direcionados a irem às comunidades na intenção de desenvolverem conhecimentos e habilidades necessários à prática profissional que exige competências específicas no que diz respeito à demanda característica do usuário do SUS. Assim, esta produção foca na experiência docente no mencionado componente curricular desenvolvida durante o ano de 2017.

A ementa relativa à IBR I aponta que a intenção do componente é desenvolver: “Análise da realidade local e sua problematização através de discussões sobre os principais determinantes sociais da saúde no Oeste do Pará. Este componente tem como finalidade central possibilitar aos discentes visitas às comunidades com suas lideranças e às famílias com o objetivo de desenvolver a escuta e o vínculo através de uma prática comum aos diversos profissionais da saúde”. Analisar e problematizar a realidade do oeste do Pará somente é possível fazendo-se uso de ferramentas específicas para tal finalidade.

No intuito de atingir tais objetivos, foram oferecidas aos educandos “ferramentas” teóricas (disponibilizadas em aulas expositivas) que intencionava auxiliá-los nas visitas de campo. Privilegiou-se centrar as discussões em sala numa questão primordial, a observação, tematizada a partir de dois pontos: saber ouvir e olhar. Destaca-se que em sala, nos encontros teóricos, baseamo-nos no texto do antropólogo Roberto Cardoso de Oliveira, “O Trabalho do Antropólogo: Olhar, Ouvir, Escrever” para demonstrar que a observação em campo se dava em múltiplas dimensões, especificamente no olhar e ouvir o cotidiano dos comunitários.

Vale ressaltar que somente após alguns encontros em sala de aula nos direcionamos às comunidades. Desse modo, apenas após ampla teorização, à luz dos conhecimentos em Ciências Humanas e Sociais, reforçou-se a importância de desenvolver habilidades observacionais, em que educadores e educandos realizam visitas, previamente “construídas” juntamente a lideranças comunitárias, à comunidades (que podem ser rurais e ou urbanas) no município de Santarém, Amazônia, Pará.

As visitas a campo, prioritariamente, foram realizadas a partir da divisão das turmas em duplas. Tendo em vista haverem dificuldades de horário, especificamente, na turma noturna, tentou-se mesclar os participantes dos dois turnos. A atividade foi acompanhada por dois educadores que se preocuparam apenas em observar se o exercício de visita ocorria sem transtornos à comunitários e/ou aos próprios educandos.

Priorizou-se a não interferência dos educadores no processo de observação. Apenas em caso de dificuldades no momento de “apresentação” entre educando e moradores é que há “intervenção”. Nesta perspectiva, as visitas em campo são o ponto central do componente IBR I, pois esta experiência sintetiza aprendizados teóricos (adquiridos em sala tendo por base a teoria social em saúde) e práticos (construídos nas comunidades visitadas de forma transversal entre educandos, educadores e comunitários).

 

Resultados e/ou impactos

Como o modelo educacional brasileiro exige mecanismos avaliativos dos processos de aprendizagem específicos, o componente IBR I usa os relatos escritos das experiências em campo como indicativo de aprendizagem. Desse modo, os educandos são estimulados a construírem e manterem um “diário de campo” no qual são anotados dados adquiridos no processo de observação nas comunidades. Este diário subsidia a produção de um relatório de visita desenvolvido por cada dupla. Indica-se que no relatório sejam escritas informações referentes às visitas, mas também uma descrição conceitual, que toma por base os conteúdos teóricos e a vivência prática, no que concerne à compreensão sobre a “observação” enquanto importante “ferramenta” profissional.

São estas anotações, usadas como conteúdo avaliativo, que embasam as reflexões aqui apresentadas. Tais dados são de significação imensurável, pois demonstram uma percepção bastante aguçada da realidade experimentada, de tal modo que os educadores evidenciaram que as observações, tais como as relativas a ambientes insalubres, por exemplo, são tratadas especificamente em componentes curriculares posteriores, a exemplo de Determinantes Sociais em Saúde.

 

Considerações finais

A partir do conteúdo anteriormente exposto, considera-se que IBR I é um importante instrumento na formação de um “novo profissional” em saúde, haja vista sua “natureza” híbrida, teórica e prática.

As visitas a comunidades é parte fundamental da formação em saúde, a realização destas a partir de um componente disciplinar possibilita que haja transversalidade entre conhecimentos práticos e teóricos. No entanto, salientamos que a presença dos educandos nas comunidades deve ser o menos “impactante” quanto possível. Desse modo, foi dado destaque ao papel, enquanto educandos, nas comunidades deveria ser apenas de observadores, que foram “auscultar” os comunitários buscando desenvolver e aprimorar habilidades as quais serão de vital importância na formação em saúde, principalmente quando se pensa que uma parte significativa dos profissionais em saúde atuam na atenção básica, locus muitas vezes reclamado como desfalcado de “humanização”.

Acreditamos ainda que estimular a observação, através da “escuta” e do “olhar” (como sugerem os conhecimentos antropológicos) da realidade de agrupamentos sociais, marcadamente usuários do SUS, propicia aos educandos que sejam cada vez mais protagonistas no processo de construção de conhecimento e na sua respectiva formação acadêmica.


Palavras-chave


IBR I; Formação em Saúde; Humanização