Associação da Rede Unida, 13º Congresso Internacional Rede Unida

Anais do 13º Congresso Internacional da Rede Unida

v. 4, Suplemento 1 (2018). ISSN 2446-4813: Saúde em Redes
Suplemento, Anais do 13ª Congresso Internacional da Rede UNIDA
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Ações de educação em saúde em terras indígenas do Alto Rio Negro, na Amazônia Brasileira: relato de ações educativas interculturais.
Hernane Guimarães Santos Junior

Última alteração: 2018-01-25

Resumo


Apresentação: Realizar atividades de saúde, requer uma série de ações com destreza e planejamento para obter qualidade no serviço. As normas e rotinas definidas para as atividades a serem realizadas pelas equipes de saúde nas aldeias indígenas não diferem das atividades preconizadas pelo ministério da saúde para qualquer estabelecimento de saúde na área urbana ou rural dos municípios do País. A Politica Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas – PNASPI, trás como propósito, garantir aos povos indígenas o acesso à atenção integral à saúde, de acordo com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde, contemplando a diversidade social, cultural, geográfica, histórica e política de modo a favorecer a superação dos fatores que tornam essa população mais vulnerável aos agravos à saúde de maior magnitude e transcendência entre os brasileiros, reconhecendo a eficácia de sua medicina e o direito desses povos à sua cultura. O objetivo deste relato e contar a experiência vivida em realizar atividades educativas em contexto interculturais, nas aldeias indígenas da etnia Baniwa na Região do Alto Rio Negro.

Desenvolvimento do trabalho: A experiência ocorreu no município de São Gabriel da Cachoeira, região do Alto Rio Negro, que é formado por um sistema complexo de pluralismo étnico. Os dados de Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro – FOIRN, mostram que este território é constituído de 23 povos indígenas organizados em suas áreas tradicionais. Destaca-se a diversidade linguística, a multivariada organização social e a diversificada ocupação de territórios, com seus ecossistemas próprios. Tais condições de existência se expressam nas manifestações materiais e simbólicas dessas etnias, com importantes repercussões em suas práticas alimentares. Este município possui a terceira maior extensão territorial entre os municípios do Brasil e em 2011, mais de 75% da população de seu território era indígena, distribuídos tanto na zona rural quanto na urbana. A população indígena da zona rural do município se distribui em cerca de 600 aldeias, em sua maioria localizada nas margens dos principais rios da região, em cinco Terras Indígenas (TI) demarcadas e homologadas: Terra Indígena Alto Rio Negro, Terra Indígena Médio Rio Negro I, Terra Indígena Médio Rio Negro II, Terra Indígena Apapóris, e Terra Indígena Rio Téa. Os Baniwa pertencem à família linguística Arawak, em 2008 apresentavam uma população de aproximadamente 5.800 indígenas residentes no Brasil, habitando toda bacia do rio Içana. Estão distribuídos em 93 aldeias na margem nos cinco Polos de saúde (Camarão, Canadá, São Joaquim, Tucumã e Tunuí Cachoeira).

Resultados e/ou impactos: Em 1999, a partir da criação do DSEI Alto Rio Negro, que abrangeu três municípios (São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos), totalizando uma população de aproximadamente 27 mil indígenas, ocorreu o processo de organização do atendimento à saúde da população indígena. O DSEI Alto Rio Negro foi organizado em 25 unidades denominadas de Polos Base. Para contratar profissionais e executar as atividades de atenção primaria em saúde, a Fundação Nacional de Saúde – FUNASA, firmou convênios com instituições da sociedade civil e Prefeituras. No município de São Gabriel da Cachoeira houve a implantação de 19 Polos base, distribuídos nas calhas dos rios Negro, Uaupés, Tiquié, Içana, Aiari, Papuri e Xié, os principais cursos d’água da região. O Rio Içana foi dividido em quatro Polos base enquanto o Rio Aiari (afluente do rio Içana) conta com um Polo base. No ano 2000, foram realizadas as primeiras atividades de saúde em terras indígenas, referente ao novo modelo de atenção à saúde indígena, com ações volantes bimestrais por inexistência de unidade física de saúde (Polo Base), para dar apoio as equipes, as atividades consistiam em realiza atendimento médico, de enfermagem e odontologia em cada aldeia, a depender da demanda reprimida, realizar atividades referente a atenção primaria à saúde (pré-natal, acompanhamento do crescimento de desenvolvimento, Hiperdia, vacinação e outras). Somente no ano de 2001 com a construção das unidades, as atividades passam a ser realizadas mensalmente nas aldeias. O relato aqui mencionado é referente as atividades realizadas na unidade de saúde (Polo Base) denominada Tucumã localizada no Rio Içana, cujos os moradores são indígenas da etnia Baniwa e falantes somente da língua Baniwa, a unidade tem em seu território 16 aldeias e aproximadamente 900 indígenas adscrito. Atuei por 5 anos nesta unidade e nos dois primeiros anos, não conseguia realizar atividades de educação em saúde, adequados para realidade local, por falta de metodologia adequada que pudessem respeitar a cultura e adequar os temas as necessidades da população. Após dois anos de atividades de saúde neste território, e amplas discussões nas comunidades com a população, conseguimos detectar quais as necessidades e qual a melhor metodologia para o momento e para realidade local. Porém para essa interculturalidade ocorrer contamos com a participação de alunos e professores da Escola Baniwa e Coripaco, criada no ano 2000, na região do polo base, a escola foi resultado de um grande movimento das comunidades da região do Içana e afluentes organizadas em grandes encontros de educação e assembleias coordenadas pela Organização Indígena da Bacia do Içana-OIBI. O projeto de educação da escola, desenvolve suas atividades tendo em vista a formação do cidadão Baniwa e Coripaco voltado para a responsabilidade do trabalho em suas comunidades, para a criatividade e para a liberdade, para o respeito aos seus próprios valores, no diálogo intercultural. A metodologia de ensino na escola é fundamentada em pesquisa, a partir do conhecimento tradicional: história de origem da humanidade do Povo Baniwa e Coripaco, conhecimentos da medicina, geografia, meio ambiente, manejo de recursos naturais para que o jovem se valorize e se identifique, relacionando-os com os conhecimentos científicos acadêmicos ocidentais. A escola por ser bilíngue, contribuiu para o desenvolvimento do projeto, pois primeira etapa consistiu em ministrar aulas para os alunos da escola sobre os temas identificados nas comunidades; a segunda etapa os alunos produziam peças teatrais, com roteiro pré-definidos, na língua Baniwa e estas peças teatrais eram filmadas em fitas VHF; e a terceira etapa consistiu em apresentar nas comunidades os filmes na língua baniwa com temas voltados para prevenção e promoção da saúde.

Considerações finais: Na experiência relatada, foi possível perceber a grande repercussão e apropriação dos temas por parte da população, pois por um lado os indígenas podiam apreender sobre as problemáticas que estavam proporcionando processos mórbidos nas comunidades, por outro lado eles presenciavam membros de suas aldeias na televisão fazendo atividades para com seu povo, atividades estas pensadas e construídas pelas próprias comunidades para serem desenvolvidas pelos alunos. A politica de saúde indígena, em suas diretrizes estabelecidas, menciona a preparação de recursos humanos para atuação em contexto intercultural, a articulação dos sistemas tradicionais indígenas de saúde, a promoção de ambientes saudáveis e proteção da saúde indígena. Porém é necessário que a atenção à saúde se dê de forma diferenciada, levando-se em consideração as especificidades culturais, epidemiológicas e operacionais desses povos e a criação de vinculo com as comunidades são primordiais para o melhor desenvolvimento de atividades interculturais.


Palavras-chave


Educação em saúde; Saúde indígena; Intercultural